1995-1997, actualizada em Janeiro de 2002
Apenas em Janeiro de 2002 me apercebi de que os textos criados em 1996 e 1997 nunca tinham sido adicionados quer à publicação distribuída pela universidade quer à versão HTML. A presente redacção corrige essa situação, além de incorporar algumas pequenas alterações que me foram sugeridas por correio electrónico por diversas pessoas ao longo do tempo.
Exemplos:
A culpa foi dele. vs. isto aconteceu por culpa dele.
O acaso juntou-os. vs. Encontraram-se por acaso.
Comi arroz de polvo. vs. O arroz de polvo estava óptimo.
Deste dinheiro no peditório? vs. O dinheiro foi mal empregado.
Serviram-me coelho. vs. O coelho estava delicioso!
Isso é mesmo de rapariga! vs. As raparigas é que gostam dessas coisas!
Não tomo banho em água tão fria. vs. A água tem de estar mais quente para eu tomar banho!
Várias expressões sem artigo:
por intermédio de, por sorte, por azar, com certeza, em benefício de, sem dúvida (nenhuma), a favor de, por amor de, com raiva, por favor, a meu favor, a meu pedido, por engano
dia lindo, cão dócil, mar azul
triste destino, novo professor, pobre mulher
ele está velho
a mesa é resistente
ele anda distraído
o engano resultou divertido
o plano saiu gorado
o Manuel saiu calado
ele ficou triste / sentado
ela permaneceu calada
eles continuaram cegos
ele manteve-se escondido/alegre durante toda a noite
ela pareceu-me bonita
ela deparou-se-me vazia/despida/inútil
ela deu-me a impressão de inteligente
ela é tida por muito esperta
vi-o feliz/ sentado/ cansado/ decepcionado
senti-o triste
ouvi-o desencantado
imaginei-o feroz/deitado/barbudo
suspeitei-o sentido/magoado
achei-a gorda
considerei-a estúpida/perdida
tomei-a por principiante
tinha os cabelos encaracolados, os olhos tristes, e a cara vermelha
levava a mão levantada
trazia as mãos sujas
os pés trazia-os vermelhos
alegres, os rapazes prepararam-se para a expedição
os rapazes, alegres, prepararam-se para a expedição
os rapazes prepararam-se, alegres, para a expedição
os rapazes prepararam-se para a expedição, alegres por terem uma tal oportunidade.
voltaram cansados
admiradas, elas não sabiam que dizer.
faz isso rápido
falar alto/baixo/baixinho
De forma simplificada, a posição anterior ao substantivo (A1) descreve uma propriedade relacionada com o substantivo, enquanto que a posição a seguir ao substantivo (A2) descreve uma propriedade objectiva do substantivo.
De N A2 pode concluir-se que é N e é A2 (de A Maria é uma criada antiga pode concluir-se que a Maria é uma criada e que a Maria é antiga (já está há muito tempo no lugar))
De A1 N não se pode (de A Maria é uma antiga criada não se pode concluir que a Maria ainda é uma criada nem que é "antiga")
Existem casos em que podemos falar de N A1 (em alguns casos, marcados abaixo com asterisco, a posição posterior também pode ser tomada pelo adjectivo A1, o que significa que o adjectivo, apesar de na posição A2, pode tomar o sentido típico de A1 tem dois).
A nova professora - a professora nova *
O bom aluno - o aluno bom *
o mau aluno - o aluno mau *
um bom amigo - um amigo bom
um bom irmão - um irmão bom *
um pobre homem - um homem pobre
um rico casamento - um casamento rico
um belo rapaz - um rapaz belo
um pequeno contratempo
uma grande mulher - uma mulher grande
uma pequena víbora - uma víbora pequena
uma antiga mesa - uma mesa antiga
a antiga casa - a casa antiga
Noutros casos, em que um adjectivo positivo é anteposto, traduz muitas vezes ironia, sobretudo quando modifica nomes aos quais objectivamente não se pode referir
um bom disparate
um lindo comportamento
um bonito destino
um belo governo
Às vezes, a posição anterior sublinha o resultado
uma boa ideia - uma ideia boa
uma má ideia - uma ideia má
uma péssima ideia
um triste casamento
um triste fim
uma boa noite - uma noite boa
Em alguns outros casos, o adjectivo na posição anterior tem um significado adverbial, que difere do significado da posição A2
um verdadeiro norueguês - um norueguês verdadeiro
um simples jantar - um jantar simples
um simples alentejano - um alentejano simples
ou seja, pode-se parafrasear as frases como
é verdadeiramente norueguês
foi simplemente um jantar
é apenas um alentejano
O jovem escritor não foi convidado.
E quem é esta jovem?
O seu pai ainda é muito jovem.
Ele é muito amigo da minha filha.
O João é um velho amigo da família.
Saramago é um escritor comunista.
Os comunistas têm grande respeito pelos órgãos directivos do seu partido.
estrela polar (=do pólo), engenheiro mecânico (= de Mecânica), economia rural (=do campo), segurança social (=da sociedade), polícia municipal (=da cidade)
A soma oferecida era elevadíssima (= que tinha sido/ que era / que foi)
O livro estragado era o meu (= que foi/ que estava/ que tinha sido)
O fruto proibido é o mais apetecido (= que foi/ que é/ que está)
Varre as folhas caídas (= que estão/ que cairam)
A família acampada ali não obedece às normas do parque (=que está / que acampou)
Os barcos fundeados naquele porto são petroleiros (=que estão / que fundearam)
A rapariga deitada é minha irmã (= que está / que se deitou)
A empresa falida despediu os funcionários (= que está / que faliu)
os acontecimentos ocorridos no passado domingo são preocupantes (= que aconteceram)
O desastre acontecido, os problemas surgidos
ele é muito viajado (= ele viajou muito)
depois de bem comido e dormido, preparou-se para partir. (= ele comeu e dormiu bem)
a Joana é muito dada, mas o irmão é terrivelmente mexido. (= dá-se muito; mexe-se muito)
a minha prima é uma mulher vivida, e o marido é muito sabido. (= viveu muito; sabe muito)
Nota: como seria de esperar, adjectivos particípios passados de verbos simultaneamente transitivos e intransitivos aceitam as duas interpretações
A Joana, admirada, não soube o que responder.
O cientista, admirado e respeitado, tormou-se um símbolo nacional.
A criança deu a resposta enganada.
Os turistas enganados queixaram-se à polícia.
(note-se a correlação entre a passiva com estar e com ser
estás enganada, temos de descer e virar à direita.
Foste enganada, essas pérolas são de plástico!)
a revolução é provável que rebente em breve.
a porta é preciso que a abram por dentro.
os tiros é possível que façam render o velho ditador.
estas fotografias não é necessário destruir.
a minha prima é sabido que não estuda. (= é sabido que a minha prima não estuda)
Os chineses é conhecido que apreciam arroz. (=é conhecido que os chineses ...)
estas obras são difíceis de ler.
estes manuscritos são passíveis de ser vendidos.
estas paisagens são agradáveis de olhar.
estes sapatos são óptimos de vender.
os miúdos são capazes de cair.
vocês são livres de sair.
os alunos estão livres de terem um novo exame amanhã.
os guerrilheiros são capazes de atingir a cidade.
ela é capaz de chumbar no exame.
Finalmente, existem algumas palavras que funcionam como determinantes mas que são homónimas de adjectivos:
um certo homem
um determinado homem
A mesa é antiga. Foi comprada num antiquário. (e não ela foi comprada)
Mas ele, ela, eles, elas usam-se depois de preposição:
A mesa estava ali. O João bateu nela e caiu.
O lago é muito fundo. O João caiu nele e ia morrendo.
O precipício é assustador. O João olhou para ele e ficou com vertigens.
Este canivete é do João. Ele não vai a parte nenhuma sem ele.
Posição depois do verbo: ênclise; posição antes do verbo: próclise; entre o radical e a terminação de futuro ou condicional: mesóclise.
Deu-me um livro.
Tem-me dado um livro todos os dias.
Estava-me a dar a um livro (ou estava a dar-me um livro)
Ia-me lendo um livro enquanto trabalhava na camisola.
Este livro foi-me dado pelo meu pai.
Esta cama tinha-me sido dada pelo meu pai.
dar-me-ás, falar-te-ia, doer-vos-ão
não me lembro,
nunca lhe dei
nada te preocupa
Quem é que o viu?
A quem é que o João o deu?
O que é que o João nunca te deu?
Porque é que não te vi? ou (mais raro) Porque é que te não vi?
ainda, já, sempre, talvez, também, só, somente.
Ainda o conheço. vs. Conheço-o ainda.
? Sempre o fizeste. vs. Fizeste-o sempre. (posição anterior muito rara)
Também a vi. vs. Vi-a também.
Já o sabes. vs. Tu sabe-lo já.
Talvez se arrependa. vs. Conheço-o talvez da escola.
Só a Joana o viu. A Joana só o viu quando... vs. A Joana viu-o só quando...
Muito se cansou ele.
Pouco o admiraram.
Todos me decepcionaram.
Alguém o viu.
Tudo se desmoronou.
Ambos se portaram mal.
Uma coisa te peço
para nos ver, sem nos dizer nada, (saber) como te encontrar, (desisti) de os convidar, antes de os vermos, sem os avisares
mas Ao levantar-se, A vê-los
pode levantar-se / pode-se levantar
querem ver-nos / querem-nos ver
deves ter-te enganado / deves-te ter enganado
começou a chatear-se / começou-se a chatear
estava a ver-te / estava-te a ver
Contudo, segundo os manuais de estilo, é sempre preferível usar o clítico após o verbo principal na língua escrita (ou seja, a primeira forma na lista anterior).
Em português do Brasil,
usando-se o nominativo ou a forma após a preposição:
ele deu isso a ela
eu ajudei ela
Podem se levantar problemas...
Me dê isso
Eu me lavo
Eu me lavarei, Ele prometeria a você
Deu-mo -> Ele Ele me deu isso
ou poderia ser mesmo omitido
Deu-lha -> Ele deu a ela (também possível Ele (o) deu para ela)
Ele tem me encontrado
Já tinham me visto.
Não queria se afastar
Todos tinham se afastado.
por minha ordem, em meu nome, para seu proveito, sem nosso conhecimento
nunca no vocativo:
Meus filhos, minhas senhoras e meus senhores
Quando o artigo é indefinido, o lugar normal do pronome possessivo é depois do nome:
um amigo meu, uma aluna minha, um problema teu, um livro vosso, umas primas nossas, ou seja, um dos meus amigos, uma das minhas alunas, etc.
quando o pronome é dele, dela, deles, delas, essa posição é obrigatória
Quando os pronomes são usados de forma predicativa, há oposição entre o uso ou não do artigo definido
estes livros são meus
ests livros são os meus (esta é a propriedade relevante destes livros por oposição a outros)
cf. These books are mine vs. These are my books.
A diferença entre seu e dele/dela/deles/delas, além de flexionarem conforme a coisa possuída e o possuidor respectivamente (os seus carros mas os carros dela), é semelhante à diferença entre os pronomes reflexos e os não reflexos: seu indica que é o mesmo que o sujeito, dele não. Assim,
O João trouxe o seu carro (tem de ser o carro do João -- ou seu refere-se ao interlocutor, como indicado a seguir)
O João trouxe o carro dele (pode ser do João, ou doutro "ele" de quem se esteja a falar)
Seu está a cair em desuso como possessivo reflexivo, porque é usado também (e sobretudo) como pronome de delicadeza (3.a pessoa, sujeito você)
Você trouxe os seus filhos?
O senhor importa-se de tirar o seu guarda-chuva daqui?
Existe um uso específico do pronomes possessivo seu, sua, seus, suas, que significa "uma certa"/alguma/ aproximadamente, ou seja é uma forma de tornar menos definida / menos directa uma dada afirmação.
Faz a sua diferença. (=Faz alguma diferença)
Terá os seus três metros. (=Deve ter por volta de três metros)
A obra tem os seus defeitos. (= A obra tem alguns defeitos)
Este e esse contrastam, no discurso escrito, em relação à proximidade e/ou distância em que o autor se pretende colocar: essa teoria é perigosa; esta teoria é muito interessante.
O uso de esse é muito mais comum no Brasil.
Que é o mais usado, porque serve para as posições de sujeito e objecto da oração relativa:
Este é o rapaz que salvou a criança.
Este é o rapaz que conheci ontem.
Para objecto indirecto ou objecto de preposição, há duas distinções que são relevantes:
- se é pessoa ou coisa (usa-se quem só para pessoas; que só para coisas; o (a) qual os (as) quais para ambos)
- e se é oração relativa restritiva ou explicativa (que usa-se só nas orações restritivas, o (a) qual, os (as) quais só nas explicativas; quem em ambas)
Vejamos pois orações relativas restritivas (ou seja, aquelas em que a oração relativa é necessária, porque restringe, e co-define, o sintagma nominal de que faz parte)
Para objecto indirecto usa-se a quem
Este é o rapaz a quem deste um livro.
O homem a quem ofereci emprego aceitou logo.
ou a que conforme a entidade for uma pessoa ou uma coisa
Este é o livro a que deram o prémio.
A tinta a que juntaste o verniz ficou óptima.
Objecto de preposição (linguagem cuidada):
O homem com quem almoçaste ontem é o meu marido.
O problema com que te debates já foi descrito antes
O assunto sobre que falámos ontem não deve ser abordado aqui
A tendência contra que luto é a da publicidade irresponsável.
O homem contra quem me declarei é membro do partido nazi.
A empresa para que trabalhamos não permite esse procedimento.
A professora para quem mandaste a carta já se reformou.
O cano por que escorre a água da chuva tem de ser reparado.
Esse foi o amigo por quem perdeu a fortuna.
O jardim em que a conheceste vai desaparecer
O político em quem mais confiava desapontou-me
O livro de que tiraste essa citação devia estar errado.
O rapaz de quem gostas está ali.
Que só não pode ser usado
A ponte sob a qual dormiu tinha pouco trânsito
A televisão é uma companhia sem a qual não posso passar.
X é uma pessoa sem quem a minha vida não valeria a pena ser vivida.
O período em que estive em Oslo foi dos melhores da minha vida (não durante o qual)
Para lugar, pode usar-se onde, mas é mais comum em que, que aliás é obrigatório para a localização temporal.
A aldeia onde nasci nem vem no mapa ou A aldeia em que nasci...
O ano em que nasci foi extraordinário para os meus pais.
Quando ao lugar está associado movimento, onde com a correspondente preposição é usado quer em relativas restritivas quer explicativas
A planta donde vem o algodão
O lugar aonde vão ter todos os caminhos
A cidade para onde foram é lindíssima.
Coimbra, para onde foram, não os desapontou.
Quando as orações relativas são explicativas, ou seja, podem ser omitidas sem perda de sentido para a oração principal, o (a) qual e os (as) quais podem ser sempre usados, mas quem também é possível para pessoas
Este livro, contra o qual vários escritores já protestaram, ridiculariza o meio literário.
O jardim da Estrela, no qual se realizam as sessões experimentais de cinema, está fechado esta semana.
A Maria, com a qual me dou lindamente, já disse que sim.
O Ricardo, pelo qual tenho a maior estima, asseverou-me que não.
A guerra, durante a qual muitas amizades foram postas à prova, foi uma época tremenda.
A pílula, sobre a qual tanto foi escrito nos anos 60, é agora um assunto pacífico.
A sociedade socialista, pela qual X lutava, não chegou ainda.
O testamento dele, do qual só me falaram ontem, altera tudo.
Quando a oração relativa, além de referir, ainda quantifica, ou seja, o sintagma nominal refere-se a uma entidade plural, que vai ser especificada através de quantificadores, os (as) quais têm de ser usados
alguns dos quais, duas das quais, a maioria dos quais, nenhum dos quais
Se a relação entre o nome e a oração relativa tem nome, pode usar-se cujo, ainda que este pronome esteja a cair em desuso
O homem cujos pais foram presos, O gato cujo dono o abandonou, A rapariga cuja vizinha a ameaçou, O rapaz cujo cão foi atropelado, A médica cujos doentes fugiram são normalmente descritos como O homem de quem os pais foram presos, O gato que foi abandonado pelo dono, A rapariga que foi ameaçada pela vizinha, O rapaz que tinha um cão que foi atropelado, A médica de quem os doentes fugiram...
Finalmente, com um pequeno número de nomes denotando forma, como é usado como pronome relativo, sempre em orações relativas restritivas:
A maneira como ela fez aquilo ainda hoje me admira.
A forma como ela se escapou não foi muito elegante.
O modo como se despediu não deixa dúvidas.
O modo como te portaste não tem desculpa.
As perguntas sobre coisas referem-se normalmente à escolha entre elementos de um dado conjunto.
Que livros preferes?
Que camisa puseste ontem?
De que fruta gostas mais?
Com que amiga tua estiveste ontem à noite?
Contra que partidos pretende lutar?
De qual dos teus primos és mais amiga?
Qual é a fruta de que gostas mais?
Com qual das tuas amigas vais ao cinema?
A qual dos teus alunos deste o recado?
Qual dos teus professores foi mais importante para ti?
Quais dos teus artigos sugeres que eu leia?
Quantos irmãos tens?
Quanta água leva este tanque?
Quão sincero é ele? mas mais frequentemente Ele é sincero?
Quão desinteressadas são as suas intenções? ou As suas intenções são desinteressadas?
O outro grupo pede informação sobre uma acção (ou estado). Além de confirmar a sua existência/ocorrência, através de perguntas sim/não (cuja resposta, a propósito, nunca é sim, mas o verbo na pessoa e tempo respectivos), pode perguntar quais os participantes, lugar e tempo, e ainda outro tipo de informação opcional, tal como causa ou modo.
A pergunta pode procurar algo indefinido
Que estás a fazer?
Que é que queres?
mas, muito mais frequentemente, diz respeito a participantes definidos
Quem (é que) roubou o meu relógio?
O que é que provocou a catástrofe?
O que é que o Pedro fez?
A quem é que o Manuel deu o livro?
Com quem é que tomou café?
Com que é que ele te bateu?
Contra quem é que o Miguel esbarrou?
Contra o que é que o Júlio se despistou?
Onde é que nasceste?
Por onde é que o gato se escapou?
Para onde é que vocês vão?
Donde é que ele é?
Quando é que o David saiu?
Como (é que) é o filme?
Como é que o gato conseguiu passar?
De quem é este relógio?
Porque é que fizeste isso?
Nos pronomes interrogativos sobre entidades, também se pode perguntar sobre a extensão de uma dada actividade ou repetição de um dado acontecimento:
Quanto tempo dormiste?
Quantos quilómetros andaste?
Quantas páginas leste?
Quantas vezes viste esse filme?
Quantos almoços fizeste?
Isto é sobremaneira visível num tipo especial de orações, iniciadas precisamente por estes mesmos pronomes, e cujo sentido é exactamente definir entidades através de propriedades, sem fixar a referência. Essas entidades têm o tipo (genérico) que o pronome indica, ou seja, quem indica pessoas, que coisas, quando tempos, onde lugares, como maneiras.
Conforme o tempo for futuro do conjuntivo, presente, ou passado, essas orações funcionam como um pronome indefinido, uma regra, ou apenas uma descrição não referencial.
No futuro do conjuntivo, descrevem o que em inglês levaria o sufixo -ever
Podem chamar quem quiserem
Podem fazer o que quiserem
O que sair no jornal sobre a Noruega vai estar errado de certeza.
Sou contra o que vocês votarem
Veste-te como gostares mais.
Vem quando quiseres.
Senta-te onde estiver mais limpo.
Não se esqueçam de me informar sobre o que vocês decidirem.
Toma quantos te apetecerem.
No presente, representam uma regularidade, uma regra, aplicável a todos os casos, presentes e futuros, descritíveis por essa oração
Quem cala consente
O que eu gosto mais é cantar.
Não acredito no que o João diz.
Ela cozinha como eu gosto.
Por outro lado, o seu uso no passado pode indicar desconhecimento
Viste quem trouxe o cão para aqui?
Quem não fez o trabalho vai ter de haver-se comigo.
Não vi o que te aconteceu.
Acho que sei o que estás a pensar.
Isso é o que leva muitas gramáticas a considerar estes casos como pertencendo à classe das orações interrogativas indirectas:
Perguntei-lhe quem (é que) era o chefe.
Não sei o que é que ele fez.
Pergunto-me como o conseguiu.
Mas, em muitos casos, esta estrutura é apenas a maneira mais económica de especificar co-referência, caso em que são por vezes descritos como pronomes demonstrativos nas gramáticas (note-se que o que é substituível por aquele /aquilo que)
Ela lavou o que eu pus no cesto.
Telefonaste quando chegaste.
Senta-te onde pus as almofadas.
Neste hotel há muitos empregados. O que trouxe a chave vai ali.
Estas freiras são esquisitas. Só gosto da que veio ontem.
Os que fizeram a partida que se acusem/são aqueles
Fez quanto pôde para evitar a sua partida.
As palavras que tradicionalmente são classificadas como pronomes indefinidos podem dividir-se em verdadeiros indefinidos, tais como
alguém, ninguém, algo, nada, alguma coisa, qualquer coisa
ou em não especificados (apenas a quantidade é mencionada)
todos, muitos, poucos, nenhuns, alguns, uns
ou simplesmente referindo entidades anteriormente mencionadas no discurso, como ambos, os cinco, e o grupo anterior. Por ex.
Não digas que nenhum teu amigo veio. Muitos vieram, mas tiveram de se ir embora porque não havia lugar.
Ele está sempre a queixar-se da comida.
Ela zangou-se com o irmão.
Neste conjunto podemos incluir os verbos de "início de posição", tais como sentar-se, deitar-se, levantar-se, acocorar-se, encostar-se, agachar-se, ajoelhar-se, estender-se, etc.. Embora o uso reflexivo seja de longe o mais comum, têm também um uso transitivo:
Ele encostou a escada à porta
A miúda sentou a boneca na escada
Em alguns casos, há uma certa diferença entre o verbo conjugado reflexivamente e o verbo transitivo correspondente, como é o caso de despachar / despachar-se, mostrar / mostrar-se.
Outras vezes é apenas raro o uso reflexivo por razões semânticas e/ou pragmáticas:
Ele deu-se um pequeno prazer
Ele concedeu-se um descanso merecido
Eles bateram-se outra vez. Não se mataram por pouco. Há quanto tempo é que se zangaram?
Quando se encontraram, não se reconheceram.
Apesar de ser o caso mais comum, o uso recíproco de "se" não se limita a dois participantes
Os deputados reuniram-se de emergência.
As equipas saudaram-se (mutuamente).
Os quatro abraçaram-se.
Vende-se casas
Fala-se português
Dá-se explicações
Não se sabe como é que a civilização maia desapareceu.
Nos primeiros estádios não se dá pela doença.
Vê-se logo que nunca saíste de cá.
Os livros compraram-se ontem. (= os livros foram comprados)
Guardaram-se os livros nas estantes. (= foram guardados)
Fazem-se encadernações (= são feitas)
Propostas aceitam-se. (= são aceites)
O cruzador afundou-se perto da costa.
A comida estragou-se.
O copo partiu-se.
O João enganou-se na rua.
Ela atrapalhou-se com a pergunta inesperada.
Eles chatearam-se horrivelmente.
O bolo desfez-se na viagem.
Os botões espalharam-se pelo chão.
De notar que existem outros verbos em que a mesma alternância se encontra em relação a verbos transitivos e transitivos:
A manteiga derreteu.
A água gelou.
A sopa arrefeceu.
Nestes casos, o verbo transitivo parece significar apenas fazer (verbo intransitivo), isto é, derreter = fazer derreter, gelar = fazer gelar, etc.)
Finalmente, existem alguns usos de "se" que não se enquadram facilmente em nenhuma das categorias acima, exemplificados por:
Está calor.
Ela é simpática.
Gosto muito de teatro.
Quando usado com acontecimentos designa um hábito ou regra (ou um futuro próximo, como veremos depois).
Como muito ao jantar.
Não bebes muito vinho.
Ela dança no Bolshoi, e ele escreve.
Quando tenho calor tomo banho na piscina.
Quem canta seus males espanta. (provérbio)
Aos sábados dou um passeio pela cidade.
Se se quiser afirmar que um acontecimento está a acontecer no momento presente, TEM de se usar a forma progressiva:
Estou a comer uma maçã e não Como uma maçã.
O que é que estás a fazer? e não O que é que fazes?
O presente pode referir acontecimentos futuros, desde que seja bem definida a sua ocorrência (ou seja, haja uma previsão não só da ocorrência, mas também da altura em que o acontecimento se dará).
Hoje dou aula às 3.
O avião chega às 9.
O filme é às 8.
Esta noite o Presidente fala na televisão.
Vou para Itália em Dezembro.
Quando receber o dinheiro, compro uma televisão.
Logo que chegares, faço o jantar.
Em alguns casos, uma frase no presente é vaga entre uma regra e um caso (futuro) único:
Quando é que almoças?
Aonde vais nas férias?
O comboio chega às 6.
Dou aula às 10.
O presente é usado em português para especificar um período passado que inclui o presente (ao contrário do inglês ou do norueguês):
Estou em Oslo desde Janeiro.
Ele é professor há vários anos.
O João toca viola desde os 10.
Estou à espera há dois dias.
O presente é também usado para fazer actos de fala (na 1.a pessoa do singular):
Prometo
Baptizo-te
Juro
Por outro lado, em reportagens desportivas, ao contar anedotas, e em livros de História antigos usa-se o chamado presente histórico:
Entra um homem num bar e pergunta: etc...
Toninho passa para Peixe, Peixe para Zézé, este centra e goooooooooooolo!
Júlio César entra na Gália, vence os gauleses chefiados por Vercingetórix e chega às Ilhas Britânicas no princípio do Verão
O Imperfeito (pretérito imperfeito do indicativo) comporta-se em muitas coisas exactamente como o Presente, daí ser chamado "o presente no passado".
No passado, o tempo normal para descrever um acontecimento ou acção é o Perfeito (pretérito perfeito do indicativo). O Perfeito localiza um acontecimento no passado, num dado tempo ou lugar, e afirma-o como um todo (isto é, implica que, se o acontecimento tiver duração, que ele já ocorreu todo).
O bebé caiu.
Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil.
Cheguei ontem.
O João deu o livro à Joana.
O Luís pintou a casa toda.
A Maria teceu esta tapeçaria.
A expressão do Perfeito é independente do acontecimento ser mencionado devido à relevância para o momento presente, ou como um facto totalmente passado:
Levaram o retroprojector para arranjar. (relevância para o presente: não está aqui)
D. Dinis mandou semear o pinhal de Leiria. (sem relevância para o presente)
Por outro lado, para descrever um estado ou propriedade no passado o Imperfeito é o tempo natural:
Os dinossauros eram répteis.
Luís de Camões era português.
O João gostava de vinho.
A Bastilha era no centro de Paris.
No século XVII, as pessoas apreciavam as mulheres gordas.
Mas usa-se o Imperfeito com acontecimentos nos seguintes casos:
A Manuela cantava ópera / vendia pronto-a-vestir numa loja da Baixa.
O João tomava banho à noite.
A Maria comia ovos mexidos ao pequeno almoço.
O Ricardo ia a pé para o trabalho.
Os intelectuais lisboetas reuniam-se no Nicola.
tal qual o Presente.
A Maria olhou pela janela: As crianças saíam.
O João afastou-se. O Pedro não lhe dava o livro. O que havia de fazer?
Quando chegava a casa, viu a Rosa a sair.
Quando entrou na loja, a dona abria as persianas.
Dirigiu-se a correr para a porta que via lá ao fundo.
A rapariga que sorria estendeu-lhe a mão.
Virou-se para a mãe, que se levantava.
Enquanto ela lavava a roupa, os ladrões levaram a televisão.
De notar que este uso do Imperfeito é restrito a estes contextos específicos. Em frases principais, a forma progressiva tem de ser usada:
A Joana estava a lavar a loiça. De repente, o Pedro entrou na cozinha.
Mesmo em alguns dos contextos acima a progressiva é preferível:
Quando a campainha tocou, a Maria estava a ler o jornal.
Enquanto ela estava a ler o jornal, o bebé comeu os bolos todos da lata.
Por outro lado, quando o Perfeito é usado com estados ou propriedades, o que é uma situação marcada, pode ter uma das duas interpretações seguintes:
A festa foi muito divertida.
O caso foi muito falado.
Ele odiou a tropa.
Nós gostámos do filme.
A Paula teve umas férias muito chatas.
Ele gostou dela (quando andava na faculdade) (mas agora já não gosta)
Ele admirou Nero (mas agora já não admira)
Ele soube tocar piano (mas agora já não sabe)
Ele foi socialista (mas agora já não é)
Ela esteve em Paris (mas agora já não está)
O meu pai foi um homem honesto.
D. Pedro V foi o melhor rei de Portugal.
De notar que este caso pode ser visto como representando a vida como um acontecimento definido no tempo e já acabado.
De facto, o Perfeito apenas indica que o estado referido já acabou. Assim,
O meu tio foi professor na Universidade de Coimbra.
pode ser usado por o meu tio já ter morrido, ou por ele ser, neste momento, professor noutra Universidade (ou simplesmente reformado).
Ele foi simpático (por ter feito isso, nessa ocasião)
Ele foi muito antipático comigo (nessa altura)
Ele foi bondoso (ao ter cedido o lugar)
Ele foi muito bem educado, eu teria respondido!
Ele foi um amor, ele foi um palerma, ele foi um bruto, etc.
No Imperfeito descrevem um estado, no Perfeito uma acção que leva a esse estado:
Eu sabia que ela não tinha pago / Eu soube que ela não tinha pago
Ela percebia que ele não gostava dela / Ela percebeu que ele não gostava dela
Ele conhecia o Jorge / Ele conheceu o Jorge (na festa)
Eu lembrava-me dele / Eu lembrei-me dele
Ela calava-se (não dizia nada)/ Ela calou-se (parou de falar)
Por outro lado, alguns verbos de movimento têm uma interpretação de posição no Imperfeito:
O comboio chegou à estação. vs. O cabelo chegava-lhe aos ombros
A criança chegava apenas à prateleira mais baixa
O filho mal chegava ao peito do pai.
A água chegava-me ao pescoço.
O homem subiu as escadas. vs. O caminho subia pela montanha.
A escada subia ao sótão.
Descemos a correr. vs. Um atalho descia até ao fiorde.
Eu fui de Londres a Edimburgo a pé. vs. A estrada ia de Londres a Edimburgo.
Tu correste até casa. vs. O rio corria até à foz.
A senhora entrou em casa. vs. A estrada entrava pela floresta.
Saíste à pressa. vs. A linha de caminho de ferro saía pelo lado norte.
O lobo rodeou a presa. vs. Uma linha de árvores rodeava o lago.
A matilha cercou o caçador. vs. Um gradeamento cercava a quinta.
Certo tipo de orações intercalares é usado para fazer como que um parêntesis no raciocínio, para explicitar uma premissa. O tempo é Imperfeito se essa premissa for do tipo estado:
Parentes, se os tinha, não queriam saber dele
Pessoas honestas, se ali viviam, não tinham hipóteses de viver uma vida folgada.
O homem guardava o dinheiro, se o tinha, num sítio tão inacessível que nem depois de morto o encontraram.
A Maria, se lá estava, não tinha dado sinal dela.
O rapaz não vira o burro, se é que lá estava.
Uma senhora, se senhora se podia chamar, tinha cuspido para o chão.
Ginástica, se a fazia, não se notava.
A tia, se dele gostava, não o mostrava.
Ou Perfeito se se referir a um acontecimento ou a um estado passado:
Parentes, se os teve, já tinham morrido há muito.
O irmão, se o viu, fez que não o conhecia.
Durante dois meses, estive doente.
Ele foi magistrado quatro anos.
Corri por duas horas.
Dormi doze horas.
mesmo quando se descreve uma actividade habitual nesse período,
Durante três anos, comi um ovo ao pequeno almoço.
Não dormi durante uma semana.
ou uma actividade em progresso (através da progressiva):
Estive a ver o filme a noite inteira.
Quando um número definido de vezes é mencionado, pela mesma razão (só depois de serem feitas se podem contar), o Perfeito é obrigatório.
Comi neste restaurante duas vezes.
Vi o (filme do) "Gandhi" três vezes.
Cem vezes desesperei.
Com a partícula já antecedendo-o, o Perfeito passa a significar ter feito num tempo indefinido, ou seja, não interessa quando, e isto tanto para acontecimentos como para estados:
Já estive em Paris.
Já viste "E tudo o vento levou"? (Gone with the wind)
Ela já foi à India.
Já gostei dele (mas agora não gosto...)
Ele já foi camionista.
O mesmo se passa com a negação de já, ainda não.
O Pedro ainda não viu a "Música no Coração" (The sound of music)
Ele ainda não foi a Holmenkollen.
Ela ainda não fez o trabalho de casa.
E com o advérbio nunca (outra possível negação de já)
Ele nunca fez esqui.
Ela nunca foi à Índia.
O marido nunca lhe disse nada.
Nunca vi um tigre branco.
Ele nunca foi honesto.
O Perfeito é usado em ordens grosseiras (nível de língua popular):
Andou!
Acabou!
Desandou!
Calou!
Além disso, o Perfeito pode exprimir futuro completado antes de um tempo hipotético, substituindo o futuro perfeito (ou composto), mas tem de coocorrer obrigatoriamente com já:
Quando acabares o curso já eu acabei o doutoramento. (= terei acabado)
Quando o Pedro for para África, tu já compraste a tua casa. (= terás comprado)
Ele vivia em Londres há dez anos. (havia dez anos, mais correcto do ponto de vista lógico, só se usa na linguagem escrita)
Ele cantava no Scala de Milão desde os dezoito anos
Um processo gradual exprime-se no Imperfeito, quando se refere a várias alturas diferentes
Cada vez entristecia mais.
Mais e mais chegava a casa a altas horas.
Estudava cada vez menos.
Dormia cada vez pior.
enquanto a expressão da gradualidade de um processo único é feita através da perífrase ir + gerúndio:
Ia crescendo em beleza e sabedoria.
O sol ia aquecendo a casa.
Ele ia enchendo o saco conforme falava.
Ela ia morrendo aos poucos.
No discurso indirecto, traduz o presente:
O Rui disse: -- Sou cantor de ópera, vou para o Porto e hei-de casar com uma rapariga rica.
O Rui disse que era cantor de ópera, ia para o Porto e havia de casar com uma rapariga rica.
A Joana perguntou: --Gostas de cinema?
A Joana perguntou se eu gostava de cinema.
Ele afirmou: -- Todos os dias ando três quilómetros a pé.
Ele afirmou que todos os dias andava três quilómetros a pé.
Finalmente, em frases com subordinadas do tipo se + Imperfeito do conjuntivo, o Imperfeito tende a substituir o Condicional em português de Portugal:
Se ganhasse a lotaria, comprava uma casa grande.
Se fosses esperta, estudavas em vez de andares em festas.
Podíamos tomar um banho na piscina se estivesse calor.
Finalmente, o chamado Imperfeito pitoresco, apenas usado na linguagem escrita cuidada, pretende transportar o leitor para uma época passada, e caracteriza-se por juntar uma data a uma frase no Imperfeito.
Em 18XX, Júlio Dinis escrevia "As pupilas do senhor reitor".
Em 1945, as tropas aliadas desembarcavam na Normandia, pondo fim ao pesadelo nazi.
Ele deitou fora o bilhete, que tinha comprado na véspera.
O João apresentou-me a rapariga que tinha conhecido na festa.
O Mais que perfeito tem várias propriedades em comum com o Perfeito. Por exemplo, pode ser usado para descrever um estado causado por uma dada acção passada (relevância de um acontecimento passado):
As fotografias tinham caído para baixo da estante.
O cano tinha descaído com a pressão.
o que corresponde respectivamente a
As fotografias estavam (caídas) debaixo da estante
O cano estava mais abaixo.
Assim como com o Perfeito, já + Mais que perfeito apenas indica que o acontecimento ocorreu, não interessando quando:
Ele já tinha comprado o bilhete quando ela lhe sugeriu irem ao teatro.
Quando o João finalmente entrou na sala, já todos tinham chegado.
Já tem contudo uma outra função, que é a de indicar precedência quando há dois Mais que perfeitos envolvidos:
Quando fora para a tropa, já tinha tido vários desgostos.
Sem já, a frase anterior refere-se a desgostos durante a tropa, e não antes de ir para a tropa.
O Mais que Perfeito é usado no discurso indirecto para traduzir o Perfeito:
-- Comprei um carro, fui dar um passeio e fiquei deslumbrado.
Ele disse que tinha comprado um carro, tinha ido dar um passeio e tinha ficado deslumbrado.
Mas não para traduzir o Imperfeito:
-- Os meus tios eram comunistas e nunca iam à igreja.
Ele disse que os tios dele eram comunistas e que nunca iam à igreja.
(e não tinham sido comunistas e nunca tinham ido à igreja)
Em geral, quando o Imperfeito é habitual, co-ocorre com o Mais que perfeito (ou seja, não há hábitos mais passados):
Ele tinha-se esquecido dos banhos que o pai tomava ao entardecer.
Ele tinha detestado os camponeses que falavam em revolução.
Compare-se com
Ele tinha detestado os camponeses que se tinham instalado nas suas terras.
em que é um acontecimento que é referido na oração relativa, e por isso deve estar no Mais que perfeito.
Em geral, o Mais que perfeito simples já não se usa na linguagem falada, ainda que possa ser utilizado na linguagem escrita por razões estilísticas (é menos pesado), sobretudo quando vários verbos são utilizados:
Os homens que amara e que a tinham amado...
Quando a vira, tinha-se apercebido de que nada voltaria a ser igual.
Há, no entanto, alguns usos idiossincráticos do Mais que perfeito simples que não podem ser substituídos pelo composto:
Quem me dera ir ao Rio!
Tomara eu que ele olhasse para mim!
Passo por tua casa esta noite.
nem para aqueles que correspondem a uma promessa ou desejo cuja data é indefinida:
Hei-de convidar-te para cá vires jantar.
Tu hás-de ser reconhecido como um grande poeta.
Igualmente, acontecimentos ou estados futuros considerados prováveis são expressos pela perífrase ir no presente mais o verbo no infinitivo:
Vou comprar um carro desportivo.
O Benfica vai remodelar a sede.
O novo aeroporto de Oslo vai ser em Gardemoen.
A Manuela vai ter outro bebé no Verão.
Quando me deres o livro, vou lê-lo de uma ponta à outra.
Assim, o futuro do indicativo em português só tem os seguintes usos
Nada te faltará
O rei nunca será esquecido
Terás sempre a impressão de ter perdido alguma coisa.
Nunca perceberás porque ele te deixou.
Não chegará a matar, mas estará lá perto muitas vezes.
Farei tudo o que for preciso.
Terá cura?
Choverá?
Não sei se fará o que prometeu.
Se fará ou não, só o futuro o dirá.
Conseguiremos manter a promessa?
Será que os vizinhos foram de férias?
Será que o João está doente? ou Estará o João doente?
Será possível?
Para exprimir dúvida sobre o passado, usa-se o futuro perfeito:
Terão chegado já?
Terá sido o Gustavo o responsável por esta balbúrdia?
Lembras-te se terás contado à tua irmã?
O futuro perfeito também se usa para exprimir um tempo futuro anterior a outro tempo também futuro:
O Miguel vai para a tropa em 1996. Nessa altura já terá feito o 12º ano.
Até que chegues, a criança terá tido tempo para fazer muitos disparates.
Quando acabares o curso, terás tido muitas ofertas de emprego./terás aprendido mais do que pensas.
embora esteja a ser substituído pelo Perfeito com já na linguagem falada.
Quando lá chegares, já eu comi a sopa.
O tempo/modo condicional é empregue em três tipos de contextos:
Quando o conheci em 1990, ele disse-me que partiria um dia para terras de África e que não voltaria.
Tu não resistirias a um tal choque.
A Joana nunca faria uma coisa dessas.
ou no futuro
Se a Rita visse isso, ficaria demasiado perturbada para reagir.
Se ganhasse a lotaria, compraria uma quinta.
Neste caso, ou seja, no contexto "frase principal com uma subordinada se no Imperfeito do Conjuntivo", o Condicional tende a ser substituído pelo Imperfeito em português de Portugal.
Teria aí uns trinta anos
Eu diria que ele estava bêbado.
Dir-se-ia que a casa tremia toda.
Finalmente, o Condicional usa-se no discurso indirecto para exprimir o Futuro:
--Nada te faltará
Ele afiançou-lhe que nada lhe faltaria.
--Ter-se-á esquecido do que combinámos?
Ela interrogou-se sobre se ele se teria esquecido do que tinham combinado.
Em consequência, é também usado no discurso indirecto livre com essa função:
O José parou. Seria possível? Teria ela feito mesmo aquilo de que o Pedro a acusava?
A Rita sorriu. Conseguiria manter a promessa? Era tâo frágil, pensou o João.
O Condicional composto apenas difere do Condicional por pressupor um tempo passado
Quando tivesses ido à tropa, já terias sido roubado de tudo.
Se tivesses feito o que te disse, terias ganho uma fortuna.
Aqui não te teriam enganado!
Teria escrito alguns livros, dizia-se.
Teríamos bebido e dito coisas que não devíamos.
O João tem estado doente.
A Maria tem estado abatida.
Este ano o tempo tem estado maravilhoso.
ou a repetição de um acontecimento nesse período
Tenho comprado muitos livros.
Nesta última semana temos posto a conversa em dia.
Neste século temos sofrido uma data de reveses.
Neste milénio a humanidade tem progredido de uma forma espantosa.
Toda a minha vida tenho tido muitas arrelias com a polícia
Quando uma frase no PPC não contém um advérbio de tempo, pode juntar-se o advérbio ultimamente sem mudar o sentido:
Tenho andado cansada (ultimamente).
O merceeiro tem vendido pouco (ultimamente).
Nâo é possível usar advérbios que contradigam a noção de "intervalo até agora", tais como: o ano passado, ontem, há dois anos, ou datas passadas. Por exemplo,
Em 1976 tenho feito muitas compras
só é possível ainda em 1976.
Os tempos compostos, por outro lado, apenas adicionam ao sentido do tempo simples a informação de que a acção/situação é encarada como passada, ou seja, já completada, e não introduzem pois nenhum elemento adicional de sentido.
É importante salientar que, ao contrário de outras línguas, os tempos do conjuntivo não apresentam sinais de desaparecimento em português.
Este tempo usa-se apenas em dois tipos de contextos:
Se vieres a Lisboa, vem cá ter a casa.
Eu pago-lhe o almoço se ele quiser.
Se ganhar a lotaria, compro uma vivenda no Restelo.
Quando vieres a Lisboa telefona-me.
Quem puder ler o artigo, por favor fale comigo.
Arranja-te como quiseres.
Faz o que entenderes.
Dentro deste grupo, destacam-se também alguns tipos de subordinadas temporais (cujo significado está relacionado com quando):
Logo que puderes, telefona-me.
Enquanto estiveres em Cuba, não precisas de cá vir.
Enquanto não fores a Bergen, não sabes do que estás a falar.
Assim que fizer este embrulho, vou para aí.
O uso mais frequente do presente do conjuntivo é o de afirmar uma dada atitude do falante perante a situação descrita nesse tempo, quer seja de dúvida, de desejo ou de mera atribuição de uma probabilidade, até à indicação de uma postura determinada quanto à acção.
Como tal, é frequentemente utilizado em orações dependentes de verbos ou expressões com esse significado, que pode ser, para efeitos de generalização, divididas em (as frases marcadas com asterisco indicam que o modo indicativo também é possível):
Duvido que o Pedro venha.
Acredito que o Partido saia reforçado deste congresso.*
Suponho que estejas cansado.*
Imagino que não te lembres de mim.
Espero que o livro seja um sucesso.
Receio que esse movimento traga consequências graves.
Tenho medo que este depoimento perturbe a campanha.
Temo que não apareça.
Desejo que tenhas uma vida muito feliz.
Insisto para que faças o que prometeste.
Nego que o tenha feito alguma vez.*
Sugiro que ponha o lugar à disposição.
Proponho que a comissão se reúna.
Peço que me dispense amanhã.
Não digo que não o conheça.*
Pode ser que o rapaz não esteja a mentir.
É possível que ele entregue o artigo a tempo.
É (pouco) provável que este livro desencadeie grande oposição.
É bom que ele seja tão aplicado.
É mau que os portugueses não votem.
É uma maravilha que as crianças aprendam uma língua sem dificuldade.
Exemplos dos mesmos verbos (marcados com asterisco) seguidos de orações no indicativo
Acredito que ele é honesto.Não nego que ele trabalha bem.
Suponho que és comunista.
Também em orações dependentes de nomes aparecem associados estes valores:
A proposta de que se construa uma nova ponte foi rejeitada.
O receio de que ele esteja doente amargura-lhes a vida.
O medo de que o furacão chegue à cidade levou já vários habitantes a fugir para o campo.
A sugestão de que se faça um livro de actas colheu grande apoio.
A esperança de que esta medida melhore significativamente as condições no país levou a uma grande receptividade por parte dos cidadãos.
É também comum omitir o verbo principal (e por vezes o que) em alguns contextos mais fixos, como é o das exclamações, desejos e ordens:
(desejo que) Viva Portugal!
(desejo que) O diabo seja cego, surdo e mudo!
(espero) Que lhe faça bom proveito!
(espero) Que lhe sirva de lição!
Se baterem à porta, (diga-lhes) que entrem.
(ordeno que) Entre!
(recomendo que) Não te esqueças do casaco.
(sugiro que) Coma mais um bolinho!
(desejo) Que o leve o diabo!
De facto, a expressão das ordens (o modo imperativo) foi quase totalmente substituído, formalmente, pelo presente do conjuntivo. Assim, ordens negativas exprimem-se sempre no conjuntivo, e as afirmativas só na segunda pessoa do singular usam o imperativo:
Não entres!
Não corra!
Saia!
Vejamos!
Ouçam!
Dois advérbios em posição pré-verbal também requerem o conjuntivo: talvez, e oxalá. Note-se que funcionam, em termos de sentido, como expressão de desejo (oxalá) e de avaliação quanto à veracidade do enunciado (talvez).
Oxalá venha depressa!
Oxalá que consigam fazer o que querem!
Ele talvez não tenha sido convidado.
Talvez queira um cigarro.
Em relação a talvez, note-se que existem alguns casos marginais em que é usado em posição pós-verbal, com o verbo portanto no indicativo, nesse caso apenas se reportando ao sintagma imediatamente a seguir:
Ele é talvez o melhor romancista do século XX.
Este hipopótamo come talvez dez quilos de forragem por dia.
Muitas conjunções em orações subordinadas também pedem o presente do conjuntivo, quando a oração principal se reporta ao presente ou futuro:
Quer chova quer faça sol, lá está ele de plantão de madrugada.
Embora seja convidado, não é tratado como os outros.
Mesmo que venha, já não chegará a tempo para ouvir o discurso.
Por mais que faça, chega sempre atrasado.
A não ser que se veja livre dela, não sei como a poderá esconder.
Contanto que faça os deveres, deixo-o sair.
Caso perca o passe, pode sempre comprar um bilhete.
Logo que ele entre, não o deixo escapar-se.
A fim de que o João não me ouça, trouxe-te para aqui.
Faço isto tudo para que não te queixes mais tarde de que não te ouvi.
Isto vai ser uma desgraça, a menos que o tal artista apareça.
Fica aqui até que a aurora desponte.
Desde que coma o bife, tem direito a sobremesa. (=a condição mínima para comer a sobremesa é ter comido o bife)
Antes que te arrependas, pára com isso! (= pára com isso para que não te arrependas)
Existem alguns casos de orações subordinadas sem conjunção, correspondendo a quer ... quer
Faça sol ou chuva, ele percorre o país de lés a lés.
Venha o rei ou a sua comitiva, não conseguem demovê-lo.
ou especificamente indicando várias hipóteses (através de uma oração com futuro do conjuntivo):
Venha quem vier, faço o discurso.
Faça-se o que se fizer, acontece sempre a mesma coisa.
Aqui em Oslo ela não conhece seja quem for que a possa ajudar nesse assunto.
Em orações relativas, o presente do conjuntivo indica uma dada propriedade sobre a qual não há ainda instância (caso particular):
Procuro uma secretária que saiba alemão.
Quero um prato que não tenha muito sal.
Não mora aqui ninguém que eu conheça.
A quem prometa mundos e fundos não se pode entregar o governo.
Por outro lado, o presente do conjuntivo é usado em expressões objecto de verbos indicando existência, expressões essas indefinidas devido ao pronome quem.
Há quem diga que a casa está assombrada.
Não falta quem goste de apoucar os outros.
Finalmente, em linguagem popular usa-se a expressão eu seja "qq coisa má" se para indicar de forma extrema que a frase seguinte é verdadeira:
Eu seja ceguinho se estou a mentir. (= Não estou a mentir)
Eu seja desgraçada se ele não me mostrou a criança. (= Ele mostrou-me a criança)
A distinção entre o futuro do conjuntivo e o presente do conjuntivo em orações relativas é semelhante àquela que opõe "uma pessoa qualquer" a "qualquer pessoa". Com efeito, uma oração relativa no presente do conjuntivo descreve uma pessoa qualquer com uma dada propriedade, mas apenas uma, enquanto que no futuro do conjuntivo descreve qualquer pessoa com essa propriedade:
Uma secretária que souber alemão arranja emprego facilmente.
Um prato que tiver muito sal é desagradável ao cliente.
Uma educadora que puder tratar desse problema será bem vinda.
Donde, em termos de implicação em termos de valores de verdade, uma dada frase no futuro do conjuntivo implica a correspondente no presente do conjuntivo (FC => PC). O que não quer dizer que seja substituível (ou aceitável) em todos os contextos.
Este tempo usa-se em dois contextos distintos:
Disse-lhe que quando viesse a Lisboa me telefonasse.
Ordenei-lhe que entrasse.
Redargui-lhe que enquanto não fosse a Bergen, não sabia do que estava a falar.
Pedi-lhe que me telefonasse logo que pudesse.
Fizesse sol ou chuva, estava sempre cedo na loja.
Contanto fizesse os deveres, ela deixava-o sair.
Ela negou que ele lhe tivesse pedido alguma vez para sair.
Ela esperava que ele se retirasse antes que deitasse tudo a perder.
Havia quem dissesse que a casa estava assombrada.
Um caso típico do imperfeito do conjuntivo como "passado do presente do conjuntivo" são as recriminações, ou "ordens passadas", próprias da linguagem oral:
Estudasses!
Fizesses o que te mandei e nada disto tinha acontecido!
Não tivesses deixado tudo para a última hora!
Se pudesse ter filhos, teria tido uma vida diferente.
Se ele casasse com a Margarida, seria muito mais feliz.
Ele comprava um Mercedes se pudesse.
Se o Manuel fosse mais sensato, nada disto lhe acontecia.
Pode-se talvez analisar este caso também como o passado do se + futuro do conjuntivo, mas esse passado traduz-se em irrealidade que pode ser projectada para o futuro:
Se fosse rica, não trabalharia.
Se ele tivesse estudado, não estaria agora na miséria.
Se ele tivesse estudado, não teria chumbado vergonhosamente.
Ele anda como se tivesse o rei na barriga
Elas comportam-se como se ele simplesmente não estivesse na sala
Duvido que ele dissesse tal coisa
Tenho pena que ele fizesse isso
Não acho que este vinho seja mau, mas acho que o outro é bem melhor.
Não acredito que o João seja assim. Acredito que ele é honesto.
Não creio que esteja errado. Creio que são três horas.
Não penso que ele seja mau de todo, mas penso que a sua companhia te é prejudicial.
Não tenho a certeza de que não haja políticos honestos, mas tenho a certeza de que são poucos.
Há muitas orações infinitivas em português, que se podem dividir em três grupos:
Eu vi o grupo aproximar-se e olhar para ela.
Eu ouvi os remos baterem no fundo do barco.
Ela sentiu o mar subir e descer.
a, de, por, para, com, sem, ao invés de
Dispus-me a visitá-la.
Gostei de a ver.
Cansámo-nos de ver esse filme.
contentavas-te com dormir ao relento?
Peço desculpa por ter trazido tanta complicação.
Os meus sobrinhos estavam ansiosos por te rever.
Esta obra foi pensada para despertar emoções fortes.
Ele dava tudo sem pensar em mais nada!
Ao invés de discutir o assunto como uma pessoa civilizada, ele amua.
Era melhor trabalhares em vez de te lamentar!
A fim de preparar o próximo ano lectivo, os professores reuniram-se.
no qual se incluem as orações temporais
Ao vê-la, ele assustou-se.
Depois de a encontrar, nunca mais foi o mesmo.
Antes de ir para a Universidade, o Marco era um rapaz tímido.
É bom descansares um bocado antes de saires
sugiro repetires o exercício
a melhor maneira é fecharmos a porta à chave
foi o ela fazer isso que me chocou
começámos a correr
deixaste de fumar
pudemos cantar
insisto em falar
ansiavam por estar sós
apesar de seres membro, tens de pagar
por gostares de música, dou-te este livro.
para cantares melhor tens de te exercitar.
antes de entrarmos, o João tinha preparado a audiência.
faço ballet além de jogar andebol.
ao entrar, prendi o casaco num prego.
a assobiar de contente, entrei em casa
ela saiu de lágrimas a correrem-lhe pela cara abaixo
os olhos dela fitavam-me como a pedirem ajuda
o velho olhou para mim com os bigodes a tremer
de tanto correr, caiu no chão
ficas rouca de tanto gritar
a rapariga a tossir é minha irmã
O disco a tocar foi-me dado pelo meu pai.
Este bule tem água a ferver.
eu vi a rapariga a lavar a escada
eu vi a rapariga lavar a escada
senti as formigas subirem-me pela perna acima
lembras-te de tomarmos banho no lago e imaginarmos que éramos focas?
descobriu-se terem as formigas invadido o sótão (= que as formigas invadiram)
imaginava serem os marcianos criaturas esquálidas e apáticas (=que os marcianos eram)
pensei darmos uma festa no bosque (=que podíamos dar)
afirma-se gostarem as crianças desse tipo de livros, embora ... (=que as crianças gostam)
sugiro escaparmo-nos o mais depressa possível (= que nos escapemos)
espero terem dinheiro suficiente para isso (= que tenham )
Tu a dares aulas de inglês? Deixa-me rir!
Ele, de uma ignorância incrível! E tu a ouvi-lo!
tens o direito de te sentires ofendido
a necessidade de termos isto pronto a tempo fez-nos fazer muitas "directas"!
tenho esperança de conseguir este emprego.
não dás mostras de estares muito contente!
a mania de dares com a língua nos dentes ia-te custando a vida!
os que tiveram a ousadia de o desafiar pagaram-no caro.
o facto de aqueles carros estarem estacionados em contra-mão constituiu durante muito tempo um quebra-cabeças para a polícia
a relutância dele em dizer a verdade ficou então explicada
o motivo para ser preso nunca veio a lume
não há razão para temermos represálias
há poucos jovens interessados em seguir o sacerdócio
os vários inquilinos são unânimes em condená-lo
estou alegre por voltarmos
estavam todos mortos por se deitar
estes livros são fáceis de ler
estas botas são muito boas de calçar
este manuscrito é impossível de decifrar
as crianças são capazes de se magoar
Infinitivo "prospectivo"
tenho várias cartas a escrever.
ainda tenho muitas coisas a fazer antes de me ir deitar
hoje ele tem muitos assuntos a tratar
tu podes é escrever o artigo para a próxima edição
ele sabe é estragar a vida dos outros
ele começou foi a gritar
ele estava era a ler o livro errado
nós temos é que começar pelo princípio
Uso de infinitivo pessoal em orações coordenadas
Podes acabar com isso e seres um bocadinho mais simpático?
Sabes do que gosto mais? Lermos ao mesmo tempo.
Sabes fingir muito bem, mas enganares-me não.
Uso do infinitivo pessoal com diferentes sujeitos
Para darmos uma boa festa, tens de te empenhar.
Para ele entrar, a Joana teve de pedir autorização ao chefe.
Inversão típica do sujeito quando este é uma oração infinitiva
É preciso chegares a horas.
Inversão do sujeito dentro das orações infinitivas que seguem os verbos declarativos
Suspeito terem os rapazes estragado o jantar, e não a Maria.
Descendo a avenida, deparei-me com ele.
Fui para o quarto, temendo que o meu segredo tivesse sido descoberto.
Em comendo, volta logo (= Quando (acabares de) comer)
Embora fazendo o que lhe mandam, não é um bom empregado.
Com os preços subindo dia a dia, não sei onde isto vai parar!
entrou em casa, tirou os sapatos e, arrumando-os na entrada, chamou: (= arrumou-os e)
passou pela Av. da República, prosseguiu até ao Campo Grande, virando para a 2.a circular. (= e virou para)
Entrando em casa, deparou-se-lhe o seguinte espectáculo: (= Entrou em casa e )
Chegou o Dr. X, respondendo pela pasta das Finanças.
Os carros formando um estranho cortejo aproximaram-se.
A casa, dispondo de duas casas de banho e duma vista fantástica, não foi difícil de vender.
Esse filme retrata um caso verídico envolvendo o primeiro-ministro americano.
A luz jorrando pelas janelas.
Ah Ah! Lendo em vez de trabalhar?
E nós desperdiçando esta oportunidade! (Bras.)
Ela suspirou, encolhendo os ombros.
Roberto: (Entrando.) Ora viva!
Voltando-se para a mulher: -- Não achas?
Fazendo a cadeira este semestre, podes seguir o tal curso. (= se fizeres a cadeira...)
caso especial (com só)
Só vendo se acredita! (= só se vires)
À hora a que sais, só apanhando um táxi é que lá chegas a tempo! (só se apanhares um táxi...)
Sendo amigo dela, não deixo de lhe criticar o seu modo de proceder
Tendo embora várias ocupações, o Rogério é uma pessoa disponível.
Embora correndo pelo Benfica, o Zé nunca esqueceu os seus tempos do CACO.
Nem pagando a gasolina eu te levo no meu carro.
Não desfazendo, a Maria Antónia está uma beleza!
Não tendo sequer boa voz, a presença dela no palco é empolgante.
Julgando o caso esquecido, ela veio ter comigo. (= porque julgava)
Não conseguindo sair do elevador, ele carregou no botão de alarme (= porque não conseguia)
A multidão começou a dispersar, prevendo tumulto. (= porque previa tumulto)
Fechei a porta da cozinha, deixando-a nos seus domínios. (de sorte que a deixei)
A tempestade viera, fazendo as árvores vergar. (de sorte que fez...)
Vendo a porta fechada, o Vicente fez um gesto de desânimo. (= ao ver a porta fechada)
Uma vez, passando por casa dela, lembrei-me do irmão. (= ao passar por casa dela)
Olhando para trás, viu-lhe os polícias no encalço. (= ao olhar para trás)
Obrigatoriamente, em português de Portugal
denota gradualidade, dispersão no tempo
Ele ia espalhando o conforto por onde passava.
O sol ia aquecendo a cabana
Ele ia enchendo o mealheiro à custa das semanada poupadas.
Ele foi fazendo amigos por aqui e por ali, até se tornar o homem mais elegível do partido.
Tinha ido escrevendo tudo o que se passava ao longo dos vários anos que ali morara, e agora o livro tornara-se uma revelação.
Cá vamos indo!
Vai andando, que eu já vou.
Olha, vai pondo as batatas ao lume, está bem?
denota iminência de um perigo que não aconteceu (=quase que)
Ups! Não vi a trave. Ia caindo!
Ele ia chumbando. Sabia tão pouco do assunto, que não sei como conseguiu passar.
O João ia morrendo, com o susto que apanhou!
Íamo-nos esquecendo da hora! Depressa, o filme começa às sete!
Eles iam-se tramando! Se não fosse o pai chegar naquela altura e interromper a conversa...
Ias-te espalhando ao comprido! Felizmente que te lembraste da resposta certa!
O particípio passado é usado em português:
Eu tinha comprado o bilhete com antecedência.
Eu tenho tido muita sorte.
Fiquei espantada com a reacção dela.
Os espectadores foram agredidos com insultos e impropérios.
Ela estava escondida atrás da casa.
Tinha os olhos inchados de tanto chorar.
Levava o cabelo puxado para cima e o casaco enrolado à cintura.
Trazia as mãos caídas e a mochila pendurada só dum ombro.
Já tenho a loiça lavada.
As folhas caídas foram levadas pelo jardineiro.
Caídas as folhas, a árvore dava-me um sentimento de desolação.
Descobertos os erros, o Ministério ordenou uma nova prova.
«Os Lusíadas», escritos no século XVI, têm sido usados como fonte de inspiração do imaginário português.
Essa quantificação, ou medição, ao referir-se a acontecimentos, pode ser efectuada através de uma modificação interna ou externa.
A modificação externa simplesmente modifica toda a descrição de um dado acontecimento:
Andei durante três horas (até me decidir a comprar uma mapa de Budapeste).
Entrei nesta loja duas vezes. (Nunca mais lá volto!)
Li a «Jane Eyre» durante seis meses. Nunca gostei de nenhum livro como aquele.
A modificação interna (sintacticamente ligada a um constituinte da frase que descreve o acontecimento) pode referir-se
Andei dez quilómetros.
Subi cem degraus.
Li 50 páginas da "Guerra e Paz" e adormeci.
Fiz quatro compras nesta loja.
Fiz vários almoços de bacalhau.
Fiz dezenas de depósitos naquela conta.
Nessa altura, ele escrevia-lhe dezenas de cartas que depois rasgava. é melhor do que ele escrevia-lhe cartas que depois rasgava dezenas de vezes.
O ponto final é usado como em norueguês quando acaba um período (ou frase). É também usado para marcar iniciais, mas para abreviaturas existem outras formas além de simples ponto (nesse caso chamado "ponto de abreviatura"). Em particular, é usado o processo de escrever em letras mais pequenas por cima e sublinhado (o mais comum é apenas º e ª com ponto por baixo), como por exemplo nos seguintes casos
Eng.ª, Dr.ª, Mª, Ex.mos, Arq.tos, M.el, D.to, P.e
ou com numerais 5ª (quinta), 2º (segundo), etc.
Com números não se usa ponto. Também não se usa para marcar decimais em números fraccionários. A vírgula é usada para isso (2,33 lê-se "dois vírgula trinta e três"). Além disso, emprega-se para separar conjuntos de mais de dois elementos:
o rapaz, o velho e o burro
os sapatos, as meias, as luvas e os cachecóis
ele deu-lhe um beijo, levantou-se e saiu.
Também é usada para adicionar informação extra a uma frase ou sintagma nominal, caso em que essa informação é delimitada por vírgulas:
O João, guloso, tirou logo o maior bocado.
A cadeira, que já estava estragada, cedeu.
Ele até foi preso, caso esse que foi muito discutido.
Um caso particular é o do chamado aposto, que produz uma descrição alternativa:D. Afonso Henriques, o primeiro rei de Portugal, nasceu nesta cidade.
Gro Harlem Brundtland, primeira-ministra da Noruega, visitará os Estados Unidos na próxima semana.
A obra-prima de Camões, "Os Lusíadas", foi traduzida para muitas línguas.
<É obrigatória a delimitar advérbios de estruturação retórica, como no entanto, portanto, por conseguinte, além disso, etc.
No entanto, o problema foi resolvido.
Ele não tinha, além disso, condições para pagar.
Existem dois casos em que o seu uso difere radicalmente do norueguês:
O homem que está ali sentado é meu primo.
Quem cala consente.
Quem chegar por último fecha a porta.
Em 1973, as colheitas foram escassas.
Em Lisboa, a semana passada, encontrei um amigo que já não via há anos.
Um caso que se prende com a estruturação retórica mas que também tem consequências em relação ao uso da vírgula é a preferência para intercalar, em português, orações subordinadas após o sujeito:
O representante português, apesar de ter tido uma actuação brilhante, não trouxe medalhas.
A chuva, embora me agrade, transtornou-me os planos.
Os exames, guardados no cofre, esperavam os alunos.
A rapariga, sentindo a surpresa dos participantes, prosseguiu:
O polícia, ao ver o homem correr, lançou-se em sua perseguição.
O aluno, para ser agradável, levantou-se.
O cão, em vez de ladrar, atirou-se ao homem.
Esse defeito, sem ser grave, pode vir a ter consequências desagradáveis.
Os portugueses, como comem muito e fazem pouca ginástica, são gordos.
De facto, a tendência é para ter orações reduzidas nessa posição, como em:O professor, apesar de competente, não conseguia cativar os alunos.
A chuva, embora pouca, alagou o quintal.
A casa dela, além de pequena, não tem luz suficiente.
Finalmente, os advérbios que correspondem a uma avaliação, à descrição do ponto de vista do falante sobre a frase, são obrigatoriamente separados por vírgulas.
Ela chegou, felizmente, a tempo.
Ela chegou a horas, felizmente.
Ela é, sem dúvida, muitíssimo inteligente.
Provavelmente, já se foram embora.
Três tipos fundamentais de estados de coisas
Adoro ler.
O mosteiro é manuelino.
Carlos Paredes trabalhava como arquivador de radiografias.
A Arminda está cansada.
O João estava a arrumar o sótão mesmo há bocadinho.
O cão está na rua.
Tenho comprado poucos livros.
O cão saiu.
O copo partiu-se.
Os romanos construiram muitas pontes e estradas na Península Ibérica.
O Manuel foi simpático.
Tomei banho hoje de manhã.
Só os acontecimentos podem ser uma resposta à pergunta: O que aconteceu <num dado período>?
Tanto acontecimentos como estados temporários permitem construções pseudo-clivadas:
O que acontece é que a Arminda está cansada.
O que aconteceu foi que o João esteve doente.
O que estava a acontecer era que a Joana estava a lavar a loiça.
O que aconteceu foi que o copo se partiu.
a. As perguntas-quando são impossíveis com propriedades:
* Quando é que Luís de Camões era português?
b. referem-se a um período indiscriminado no interior das fronteiras do estado:
Quando é que ele estava doente? Ontem.
(e, por isso, têm um uso relativamente limitado. Contextos possíveis são uma deficiente audição de uma prévia ancoragem ou uma procura na memória.)
c. localizam cabalmente um acontecimento:
Quando é que os romanos contruíram pontes na Península Ibérica?
Quando é que o copo se partiu?
Quando é que tomaste banho?
a. Expressões descrevendo propriedades ou estados temporários mantêm esse valor no Imperfeito
Ela era muito simpática
Ela estava bastante doente
b. Expressões descrevendo acontecimentos transformam-se em propriedades (valor habitual)
Eu lavava carros antes de dar aulas.
Ela comia uma sanduíche antes do jantar.
ou em estados temporários (valor imperfectivo simples, a cair em desuso)
O João viu a Maria quando passava pelo jardim.
Enquanto escrevia o livro não tinha paciência para ninguém.
c. Ao invés, expressões descrevendo acontecimentos no Perfeito mantêm o seu carácter de acontecimentos
A boneca caiu.
d. Enquanto que expressões descrevendo estados temporários no Perfeito indicam que esse estado terminou (aspecto perfectivo)
Estive doente.
Ele esteve a lavar a loiça antes de eu chegar.
e. E propriedades ou qualidades no Perfeito correspondem quer a um acontecimento
O João foi antipático.
quer a um estado temporário terminado
O meu tio foi professor na Universidade de Coimbra.
Estados temporários mantêm a sua identidade (acrescida da indicação de que se referem a um período até agora)
Tenho estado a ler.
Tenho estado doente.
Acontecimentos adquirem uma indicação de pluralidade indefinida
Tenho corrido.
Tenho comprado muitos livros.
Não tenho ido ao cinema.
E propriedades / qualidades transformam-se quer em estados temporários
Tenho sido professora.
quer numa sequência de acontecimentos
Ele tem sido simpático.
Acontecimentos numa oração desde são tomados com um todo, indicador da localização do extremo inicial do intervalo descrito pelo desde:
Desde que caiu o João anda de muletas.
Desde que fui professora que não acredito no sistema de ensino.
Estados temporários, pelo contrário, correspondem na sua totalidade à oração desde, isto é, é o início do estado que marca o extremo inicial do intervalo
Desde que estou doente não vejo o João.
Desde que vivo em Oslo tenho feito muito esqui.
E o mesmo se passa para propriedades: é o início da propriedade que identifica o início do intervalo
Desde que sou professora/que dou aulas à noite ando muito cansada.
O comportamento com já é semelhante ao com desde: com efeito, já indica que um dado acontecimento ocorreu na sua totalidade antes do ponto temporal em que o falante se situa
O rei já chegou.
enquanto que com um estado temporário indica que o início do estado ocorreu antes desse ponto, mas que se mantém:
Ele já está a dormir.
Ele já está em Boston.
Finalmente, uma qualidade tem de ser transformada num estado
ele já é velho
ou numa mudança de estado
o namorado dela já é loiro (implica que mudou de namorado)
Algumas expressões temporais em português também indicam automaticamente que se referem a uma propriedade ou a um acontecimento. Por exemplo, as que se referem aos dias da semana ou a (algumas) partes do dia:
Assim, na quinta feira e quinta-feira só podem indicar uma dada (e fixa) quinta feira, onde pode ser localizado um acontecimento ou um estado temporário, enquanto à quinta-feira ou às quintas-feiras necessariamente descreve uma propriedade:
Na quinta feira vi o Miguel.
Quinta-feira vamos ao cinema.
À quinta a biblioteca fecha à uma.
Davam grandes passeios aos domingos.
Dentro da classe dos acontecimentos, podemos ainda distinguir entre Mudanças e Obras, assim como classes compostas, a mais importante das quais é a das Séries, mas também foram identificadas classes concisas do tipo Mudança + Obra, e Obra e depois Mudança.
Obras demoram tempo; Mudanças descrevem uma mudança. Estas dois tipos de acontecimentos têm várias propriedades linguísticas que os distinguem:
No caso das Mudanças, que não são conceptualizadas como tendo duração, o aspecto progressivo, quando possível, adiciona outros sentidos:
O comboio deve estar a chegar.
A casa está a cair aos bocados.
Tu estás a ficar velho.
acabei de chegar
acabei de pôr a mesa
corri das cinco às sete
escrevi a tese de Novembro de 1995 a Junho de 1996.
(i) Uf! Por pouco ias caindo! (Mudança)
Eu ia contando tudo, mas lembrei-me a tempo do que tinha prometido. (Obra)
(ii) O padre ia entrando em todas as casas, enquanto os acólitos levavam a cruz. (Mudança)
O presidente ia cumprimentando os altos dignitários à mediada que se dirigia para a mesa. (Obra)
(iii) O sol ia aquecendo a cabana.
Ela lá vai trabalhando na tese.
Ele voltou a entrar em casa. (dentro outra vez)
Ele tornou a adormecer. (a dormir outra vez)
Ele fechou outra vez as janelas. (fechadas outra vez)
Ele cantou o hino nacional outra vez. (cantou outra vez)
Ele escreveu o livro outra vez. (escreveu outra vez)
Caídas as folhas, a árvore sucumbiu. (as folhas caíram)
Chegada a Lisboa, a Maria procurou hotel. (a Maria chegou a Lisboa)
Partidos os copos, não havia maneira de servir o vinho. (os copos partiram-se)
Arrefecidos os ânimos, cada um voltou para sua casa. (os ânimos arrefeceram)
Escondidas na cozinha, as crianças riam-se. (as crianças esconderam-se)
Obras requerem concordância com o objecto, sendo portanto agramaticais se intransitivas:
Levadas as mesas, não tínhamos onde nos sentar.
Construída a casa, festejámos.
*Rido,
De notar que semelhante fenómeno foi descrito por Casteleiro (1981) sob a generalização de que apenas verbos intransitivos cujo significado inclua uma mudança de estado aceitam esta construção, e por Mateus et al. (1989) através da estipulação de duas subclasses diferentes de verbos intransitivos, os inergativos e os inacusativos.
Já cheguei = já cá estou
Já entrei na floresta = já estou na floresta
Já escrevi um livro
Já comi o bolo
De notar que neste teste é preciso distinguir entre o uso de já como localizador temporal e o uso quantificacional.
Séries são sequências de um número indefinido de acontecimentos, necessárias para explicar
Ele tem corrido
Ele tem perdido as chaves
Ele lavava carros
Ele escrevia poesia
Ele anda a arrumar o sótão (várias fases da arrumação)
Ele anda a fumar muito (várias ocasiões de fumar muito)
Ele anda a perder os amigos (várias perdas)
Ele começou a entrar tarde em casa
Ele deixou de abrir as janelas
Outras classes compostas por mais do que um acontecimento são
(i) Mudança + Obra (Mudança correspondendo ao início da Obra)
Ele pôs-se a descansar à sombra da árvore e ainda lá está.
Ele pôs-se a comer logo que tu saíste.
(ii) Mudança + Obra (Mudança correspondendo ao fim da Obra)
Acabei de pôr a mesa e fui-me deitar.
Acabei de pôr a mesa às 3.
(iii) Obra e depois Mudança
Ele atirou o casaco para cima do sofá.
Eles foram empurrados para a valeta.
Expressões em português que identificam elementos de classes distintas, mas que são empregues em vários contextos em que não é necessária decisão:
Aquisições (Mudança ou Estado): lembrar, chegar a, saber que, rodear, etc.
Estado ou qualidade: ter
Moradas (Obra ou qualidade): viver, morar
A utilização de classes vagas permite casos de co-classificação (as classes não são mutuamente disjuntas), e torna-se especialmente esclarecedora na análise da tradução de tais elementos para línguas que não permitam preservar a vagueza.
Última actualização desta página: 10 de Novembro de 2003.
Agradeço a todos quantos façam uso do presente texto que me enviem comentários, críticas e sugestões para Diana.Santos@sintef.no.