<DOC>
<DOCNO>FSP940327-145</DOCNO>
<DOCID>FSP940327-145</DOCID>
<DATE>940327</DATE>
<TEXT>
Secretário-geral diz em entrevista que quer ver Pelé se abraçar com o presidente da entidade, João Havelange
RICARDO SETYON
MICAELA TRIGO
Especial para a Folha, de Túnis
O secretário-geral da Fifa, o suíço Joseph Blatter, consegue ter a responsabilidade de coordenar mais países do que a própria ONU, sem nunca perder o sorriso, a cordialidade e, principalmente, a paciência.
Em uma conversa exclusiva com a Folha, em Túnis, capital da Tunísia, onde teve início ontem a 19ª Copa da África de Nações, Blatter liberou-se de muitos empenhos e compromissos e disse, em bom português, que concordou em ser entrevistado "porque vocês são do Brasil".
Alguns delegados das federações africanas acreditam que ele tenha mais prestígio do que o próprio Boutros Ghali, secretário-geral das Nações Unidas.
*
Folha - Dizem que o senhor é uma das pessoas mais difíceis de entrevistar.
Joseph Blatter - De jeito algum. Tenho, é verdade, uma agenda muito cheia de compromissos, mas devo dizer que não só gosto de conceder entrevistas, como lhes segredo uma coisa: eu sou um homem de comunicação. Fui jornalista esportivo por algum tempo e ainda, após a minha faculdade de economia, fiz um curso superior de relações públicas, pois isso me fascina.
Folha - Aqui na África, são muitos aqueles que acreditam que o próximo presidente da Fifa poderia ser o senhor.
Blatter - Não respondi perguntas sobre o tema das eleições a ninguém, mas, como vocês são de um jornal brasileiro, vou dizer algo. Eu acredito em uma coisa muito importante: se alguém cogita o meu nome para uma sucessão do atual presidente, isto não é nada mais do que uma homenagem a João Havelange. Eu não sou aquele que tem de dizer e decidir se Blatter é ou não candidato à presidência da Fifa. Caberia a um ou mais afiliados trazer o meu nome a uma eventual candidatura. Pessoalmente, acredito que o meu trabalho de secretário-geral é muito importante e eu sigo fazendo o necessário para o crescimento deste esporte que tanto amo.
Folha - Quais são as suas relações com Havelange, sinceramente?
Blatter - Excelentes. Respeitamo-nos e dividimos muitas opiniões. Para aqueles que, talvez, esperassem o contrário, devo dizer que não só fizemos muitas coisas importantes juntos, mas que basta um olhar para que eu e ele nos entendamos sobre um assunto. Ele é um homem excepcional, ao lado de quem eu tenho grande prazer e orgulho em trabalhar. Um homem que trouxe honras ao seu país e ao mundo do futebol.
Folha - Pelé e Havelange. Qual é a sua opinião sobre aquilo que vem acontecendo?
Blatter - Acredito que seja muito triste, mas que tudo deverá terminar bem. Pelé é um gigante do futebol e tem a simpatia de todos nós. Realmente, sonho em ver os dois sobre um palco, abraçando-se amigavelmente, seria maravilhoso. Ele é um grande amigo, exatamente como Havelange.
Folha - Como vê o próximo Mundial? E a seleção brasileira?
Blatter - É a história que está acontecendo perante os nossos olhos. Os EUA organizando um Mundial de futebol seria, para muitos, um sonho. Apesar de todas as críticas e obstáculos, todos os ingressos foram vendidos e teremos, sem dúvida, um campeonato de alto nível. Classificaram-se os melhores e, infelizmente, algumas seleções tradicionais e fortes não tomarão parte, como Portugal e Inglaterra. Mas veremos um grande futebol. Não tenho favoritos, mas quero ver ótimas partidas. Quanto ao Brasil, quero dizer que aquela seleção de 1970 foi simplesmente um sonho. Se o Brasil não vence mais Mundiais é porque não consegue jogar aquele mesmo futebol.
Folha - O senhor é realmente um fã do futebol brasileiro?
Blatter - Sim. Não sei se sabiam, mas eu já fui um jogador de futebol e até joguei partidas internacionais, em nível universitário, e sempre sonhei com o futebol brasileiro. Mas o problema do Brasil foi que os técnicos sempre tentaram imitar, em alguns pontos, o sistema europeu e tiveram problemas. Agora, com o Parreira, que é um homem de grande inteligência, o Brasil me parece ter reencontrado a sua grande forma. Seria excepcional ver o Brasil novamente campeão do mundo.
Folha - Qual é a sua opinião sobre o futebol africano?
Blatter - Sem dúvida, é um daqueles que mais evoluíram nos últimos anos. Quem entusiasmou o mundo nas últimas Copas, além dos africanos? Quem vem acompanhando o futebol jovem sabe do esplêndido sucesso dos africanos nos torneios internacionais.
</TEXT>
</DOC>