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<DOCNO>PUBLICO-19940115-093</DOCNO>
<DOCID>PUBLICO-19940115-093</DOCID>
<DATE>19940115</DATE>
<CATEGORY>Nacional</CATEGORY>
<AUTHOR>ASLV</AUTHOR>
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Sem sombra do Acácio
Houve um tempo em que o empresário teatral Sérgio de Azevedo ameaçou oferecer-lhe um lugar na revista à portuguesa. Acácio Barreiros era assim uma espécie de deputado-espectáculo, mal encarado e com um bigode farfalhudo, e berrava no hemiciclo da Assembleia da República contra tudo e contra todos. Era o rosto da UDP em S. Bento e não havia sessão em que a sua imagem descomposta e revolucionária não marcasse lugar na TV.
Esta semana, por obra e graça da deputada Edite Estrela que alguns portugueses decidiram promover a presidente da Câmara Municipal de Sintra, Acácio voltou ao Parlamento e a oportunidade de ingressar no teatro revisteiro - desperdiçada nos idos de 70 - revela-se irremediavelmente perdida. Está discreto, silencioso, consensual e nada polémico. Uma imagem mais adaptada aos tempos - «o estilo parlamentar mudou muito» -, e ao centro a que aderiu desde 83, quando entrou para o Partido Socialista.
Pelas mãos do PS, Acácio já tinha feito uma passagem pela bancada parlamentar socialista entre 85 e 87. E agora regressa, depois duma experiência como autarca em Vila Franca de Xira onde foi vereador durante quatro anos. Diz que registou na memória imagens «chocantes» das amarguras do subúrbio. E esta é a única temática que, para já, lhe sugere algum entusiasmo e motivação para futuras intervenções parlamentares.
Ainda não falou nem sabe quando vai falar, porque ainda está «na fase de ver». Para quem vem duma câmara, o ritmo parlamentar «é estranho», e o «bichinho» tribunício dos tempos da UDP já é «uma questão arrumada» na cabeça de Acácio. Instalado na direcção do segundo maior partido português, Acácio Barreiros fala do PS no tom mais consensual do mundo, perfeitamente ajustado às preocupações do secretário-geral de conseguir a unidade entre os vários ramos da família. Muito próximo de João Soares, com quem integrou a chamada «minoria soarista», acha que «hoje não faz sentido falar de tendências» e confessa-se mesmo «cansado de algumas guerras e de alguma intrigalhada» que já não o motiva.
O tom de voz de Acácio Barreiros não engana. É difícil acreditar que ainda tenha pachorra para um discurso inflamado e só quando fala de Cavaco Silva recupera algum entusiasmo. «Tenho-lhe uma grande aversão. E ao que ele representa de insensibilidade aos valores que mais prezo». Para derrubar Cavaco, Acácio não tem uma fórmula original. Também aqui está com Guterres: uma união com o PCP vinha a calhar, mas tinha que ser com outro PCP - com este não, porque «não oferece sinais sérios».
Uma «nuance», enfim, a propósito do Congresso «Portugal: que futuro?». Acácio não está na mesma onda que José Lamego, que ontem opinou que nenhum dirigente do PS deveria pôr os pés naquela iniciativa tão «simpática» ao Presidente da República. «Penso lá ir», diz Acácio Barreiros, que confessa professar uma «grande solidariedade» com Mário Soares.
Com 45 anos, Acácio está satisfeito por voltar às lides parlamentares, embora estranhe «estes tempos de maioria absoluta, em que o Governo controla a Assembleia». Recorda com saudades o «brilhantismo» de um Adelino Amaro da Costa ou dum Vital Moreira. E as «noitadas que a televisão passava em directo até às três da manhã». Agora, nem noitadas, nem Adelinos, nem os sobressaltos dos tempos de minoria. E assim não há entusiasmos doutrora que resistam. Ângela Silva
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