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<DOCNO>PUBLICO-19940304-052</DOCNO>
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<DATE>19940304</DATE>
<CATEGORY>Mundo</CATEGORY>
<AUTHOR>MSL</AUTHOR>
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Partido de extrema-direita pode entrar no Governo israelita
Rabin procura companheiros
Margarida Santos Lopes*
O primeiro-ministro israelita quer integrar um partido de extrema-direita na sua coligação de centro-esquerda. Mas como é que o Tsomet, opositor do processo de paz, se pode aliar a um governo prestes a assinar um acordo com a OLP? É que Rabin descobriu que as fraquezas dos outros podem ser a sua força.
Os líderes dos dois principais partidos de esquerda do Governo israelita -- o Trabalhista e o Meretz -- reúnem-se hoje, para analisar a possível entrada na coligação do Tsomet, um grupo nacionalista da extrema-direita que se opõe às negociações de paz com os árabes.
O Meretz, que tem direito de veto à inclusão de outros parceiros na aliança governamental, manifestou-se ontem contrário à presença do Tsomet. Alguns analistas prevêem uma rebelião das bases, até mesmo entre os trabalhistas, se o partido de Rafael Eytan, um dos arquitectos da invasão do Líbano em 1982 quando era chefe de Estado-Maior do Exército, for integrado na coligação.
«Uma tal iniciativa após o massacre de Hebron é totalmente inaceitável, porque teria efeitos negativos sobre os nossos interlocutores palestinianos e sobre os árabes israelitas», disse o ministro do Ambiente, Yossi Sarid, um dos dirigentes do Meretz. «Somos favoráveis ao alargamento da coligação, que deve tomar decisões sem precedentes na história do sionismo, mas recusamos associar-nos ao Tsomet».
Grande sucesso nas legislativas de 1992, o estreante Tsomet conquistou oito deputados no Knesset (Parlamento), tornando-se uma das mais importantes forças políticas direitistas. No entanto, em Junho último, verificou-se uma cisão e três dos seus deputados formaram um novo partido, o Yiud. Os dissidentes acusaram Eytan de liderança autocrática e irregularidades financeiras, designadamente de ter desviado fundos da campanha eleitoral para uma instituição de deficientes mentais dirigida pela sua amante. Eytan defendeu-se, dizendo que contribuiu para uma «obra de caridade cuja directora era, por coincidência» sua namorada.
Eytan está, pois, numa situação de fragilidade que o primeiro-ministro Yitzhak Rabin quer agora aproveitar em seu benefício. A entrada do Tsomet faria regressar à coligação os ultra-ortodoxos do Shass, favoráveis à paz mas sujeitos a muitas pressões do seu eleitorado sefardita (judeus orientais), tradicionalmente hostil a concessões aos árabes.
Com o Tsomet e o Shass do seu lado, Rabin poderia jogar um contra o outro e diminuir as reivindicações de ambos. «Tenciono reforçar o Governo que é, de facto, minoritário, porque sem uma maioria parlamentar sólida, ser-lhe-á impossível realizar os seus objectivos», disse ontem o primeiro-ministro numa cerimónia num «kibbutz» no Norte de Israel.
Pedido grotesco
Neste momento, Rabin conta com o apoio de 44 deputados trabalhistas e 12 do Meretz entre os 120 do Knesset. Conta também com os votos de três parlamentares do Partido Comunista e dois do Partido Democrático Árabe, que ameaçaram abandonar o chefe do Governo se ele se aliar a Eytan.
Rabin diz ser inconcebível que a política de paz do Governo impeça a adesão de outros parceiros à coligação, mas ao mesmo tempo insiste que o processo de paz tem de ser legitimado por uma maioria. Como é que o Tsomet pode entrar nestas condições?
Aparentemente, Eytan só fará parte do Governo depois da assinatura de um acordo com a OLP. Ou seja, o líder do Tsomet não seria responsável por esse pacto, mas também não impediria a sua aplicação, porque integraria a coligação quando a autonomia palestiniana já estivesse em vigor.
Segundo a rádio de Israel, Eytan reclama os ministérios da polícia e da segurança interna, uma exigência que analistas em Jerusalém consideraram «grotesca e ridícula» sobretudo depois do que aconteceu em Hebron -- o massacre de dezenas de palestinianos numa mesquita por um colono judeu opositor do processo de paz. Ninguém acredita que Rabin ceda pastas sensíveis e, se houver entendimento, Eytan receberá um cargo muito menos significativo.
Parceiros do plebiscito
A imprensa indicou também que Rabin prometeu a Eytan autorizar a ocupação de vários milhares de apartamentos em colonatos que permanecem vazios. A promessa foi considerada um «gesto vazio, para salvar aparências», porque toda a gente em Israel sabe que uma grande parte dos colonos está a abandonar os territórios ocupados.
A jogada de Rabin é, supostamente, mais ambiciosa. Ele quer não só integrar no Governo os cinco deputados do Tsomet que permaneceram leais a Eytan como os três dissidentes que criaram o novo partido. E se outros nacionalistas e religiosos quiserem seguir o exemplo, as portas estão abertas.
Com uma coligação maioritária, Rabin evitaria o referendo que prometeu aos israelitas sobre a devolução dos Montes Golã e de outros territórios árabes. Os novos parceiros teriam, assim, o valor de um plebiscito.
A OLP avisou que a entrada do Tsomet poderia «enviar sinais errados» aos palestinianos, numa altura de grandes tensões depois do massacre de Hebron. A organização suspendeu as negociações de paz e pediu «protecção internacional» para os residentes dos territórios. O Conselho de Segurança da ONU estava ontem à noite a analisar o possível envio de observadores.
Entretanto, na Cisjordânia e em Gaza, o Exército israelita libertou ontem 400 prisioneiros palestinianos e deteve um segundo colono do movimento extremista Kach, numa tentativa de sossegar os ânimos. Aparentemente resultou, porque a violência abrandou. Em Jerusalém, crê-se que, assim que as negociações forem retomadas, um acordo será assinado em «poucos dias».
*Com David Landau, em Jerusalém
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