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<DOCNO>PUBLICO-19940520-095</DOCNO>
<DOCID>PUBLICO-19940520-095</DOCID>
<DATE>19940520</DATE>
<CATEGORY>Nacional</CATEGORY>
<AUTHOR>RT</AUTHOR>
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Soares distante do pré-candidato Sampaio
Mário Soares achou precipitada a legitimação da candidatura de Jorge Sampaio tal como foi assumida publicamente por alguns dos organizadores do Congresso «Portugal: que futuro?», e este constituiu outro dos pontos de divergência entre o Presidente e o comandante Gomes Mota. Embora a questão presidencial não tenha sido tema forte de conversa no jantar que, na terça-feira à noite, juntou Soares e alguns amigos em casa do empresário Dias da Cunha, onde o PR criticou os ataques de Gomes Mota a António Guterres, ficou claro que também no que toca à candidatura de Sampaio o Presidente não está em sintonia com o seu ex-mandatário.
Gomes Mota é acusado por alguns conselheiros do Presidente de estar empenhado em posicionar-se como «o candidato a mandatário do candidato Sampaio». E embora ninguém conteste que Jorge Sampaio é, neste momento, «o candidato melhor posicionado» à esquerda, ao ponto de parecer já «intorneável», é um conselheiro muito próximo de Soares quem diz que este não é «o candidato» do Presidente. Quem agradava ao PR, é sabido, era um independente chamado Vasco Vieira de Almeida, que disse que não. E entre os socialistas «Soares preferia alguém da sua confiança». Sampaio nem sempre o foi como prova a história do PS.
Segundo o PÚBLICO apurou, o Presidente começou por não gostar da forma como a questão presidencial foi enxertada nos ecos do Congresso da FIL por considerar que isso legitimou as teses que sempre o acusaram de pretender, entre outras coisas, aproveitar aquele forum para lançar um candidato presidencial. Mas mais do que isso, Soares está a acompanhar a pré-candidatura do ex-líder socialista com um distanciamento tal que leva alguns dos seus confidentes mais próximos a concluirem que Sampaio não é «o candidato do seu coração».
«O Presidente reconhece que, em parte por ausência de uma estratégia clara da direcção do PS, e também por uma série de hesitações de algumas pessoas, Sampaio acaba por ser neste momento um candidato quase intorneável», admitem. Mas logo se acrescenta que «sobre esta matéria ainda muita água pode correr debaixo das pontes». Resta saber se as condições ainda serão propícias, depois da mais recente crise no PS ter reforçado, como tudo indica, as posições dos sampaistas que correram a solidarizar-se com Guterres, num gesto que ninguém acredita que não venha a exigir contrapartidas.
Nesta matéria, o que o Presidente sente não será muito diferente do que sente Guterres, ou seja, ambos começaram por ser confrontados com o avanço de Sampaio que ao assumir publicamente que não desdenharia um confronto presidencial com Cavaco deixou, quer Soares, quer o líder socialista, perante um facto consomado. E perante a actual turbulência na «família» socialista, Soares volta a estar como Guterres: prioritariamente interessado numa vitória nas legislativas, o que tenderá a condicionar a estratégia para as presidencias, agora com Sampaio tendencialmente mais forte. Não terá sido por acaso que um amigo de Soares desabafou esta semana, por entre a turbulência, que «as declarações de Sampaio de apoio a Guterres foram uma pura hipocrisia».
Para já, o Presidente mantém-se «desinteressado» da querela presidencial. E quando se pergunta o que poderá levá-lo a interessar-se vivamente pela questão, ninguém tem grandes dúvidas: o eventual avanço de Eanes mobilizaria o PR, que inclui nos seus objectivos até 96 travar o regresso do seu «inimigo político» ao palácio de Belém. Num hipotético cenário de confronto entre Eanes e Sampaio parece óbvio que o actual presidente da câmara de Lisboa poderia contar com o empenhado apoio de Mário Soares. Noutro contexto, já não é tão certo o que fará o Presidente, que agora parece sobretudo empenhado em ver como é que o PS se gere internamente. Ângela Silva
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