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<DOCNO>PUBLICO-19940703-045</DOCNO>
<DOCID>PUBLICO-19940703-045</DOCID>
<DATE>19940703</DATE>
<CATEGORY>Mundo</CATEGORY>
<AUTHOR>JAF</AUTHOR>
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Arafat divide os árabes
«Mais valia ter morrido...»
A visita de Yasser Arafat à Faixa de Gaza dividiu uma vez mais os «irmãos» árabes, uns elogiando-o por ter feito regressar o povo palestiniano ao «ciclo da História», outros desejando que o líder da OLP tivesse morrido no exílio.
Os sírios, por exemplo, que sempre tentaram influenciar as decisões de Arafat e dominar o movimento palestiniano, noticiaram ontem o seu regresso à Terra Prometida, mas preferiram realçar as acusações, as críticas e os protestos que a sua visita gerou.
«Arafat em Gaza, condenado pelos palestinianos e protegido pelos israelitas», titulou o diário oficial de Damasco, «Tishreen», num artigo de primeira página. Depois, num comentário separado, acusou Israel de se «concentrar em acordos separados e negociações secretas, para obrigar os árabes a fazerem mais concessões e a aceitarem uma fórmula de paz em troca de paz».
A Síria -- tal como os palestinianos, a Jordânia e o Líbano -- iniciou negociações com Israel, em 1991, na Conferência de Madrid, com base no princípio «território em troca de paz». Quase três anos depois, são poucos os progressos alcançados nas conversações bilaterais, já que ambas as partes continuam relutantes em definir as suas posições. Israel reclama uma paz total antes se comprometer com uma retirada dos Montes Golã, conquistados na guerra de 1967 e anexados em 1981; Damasco exige uma retirada total, antes de clarificar o tipo de relações que está disposto a estabelecer com o Estado hebraico.
Os sírios ainda não se refizeram do choque dos contactos secretos que conduziram ao reconhecimento mútuo Israel-OLP, e ainda recentemente verberaram o rei Hussein da Jordânia por ter feito um acordo com os israelitas que em breve poderá conduzir a um tratado de paz.
Os israelitas contam agora com o secretário de Estado americano, Warren Christopher, esperado em Jerusalém no próximo dia 17, para pressionar a Síria (e subsequentemente o Líbano, dominado por Damasco) a pôr as cartas na mesa. Para um regime que durante décadas ensinou o povo a odiar a «entidade sionista», é difícil, por mais autoritário que seja, impor uma nova mentalidade, sem correr os riscos de uma revolta. A grande dúvida de Israel, como disse ao PÚBLICO um diplomata, não é saber se o Presidente Hafez Assad quer a paz, mas se ele pode fazer a paz.
Para o diário de Beirute «as-Sharq», próximo da Síria, Arafat não devia ter regressado: «O líder da revolução regressou mas sem revolução. O líder da libertação regressou, mas onde está a libertação? [...] Mais valia ter morrido em Beirute, Amã ou Tunes, a fim de dar às gerações vindouras uma razão para se manterem ligadas à causa que se perdeu na euforia do seu regresso».
Um outro jornal libanês, o conservador «an-Nahar», crê que «seja qual for a área de território que Arafat ganhou, é suficientemente grande para os palestinianos regressarem ao ciclo da História e não serem mais um povo excluído».
Em Amã, o «Jordan Times» disse que «será muito difícil para um homem habituado a passar uma considerável parte do seu tempo no ar pôr os pés em terra e envolver-se de imediato na gestão diária dos assuntos do Estado». No entanto, acrescentou, «mais difícil será, quer para a sua administração quer para o seu povo, se ele continuar a viajar entre as várias capitais do mundo, deixando a tarefa de reconstrução da pátria a pessoas menos preparadas».
«Concorde-se ou não», salientou por seu turno o diário «al-Ra'i», também jordano, a visita de Arafat «entrou na História». No Cairo, o pró-islâmico «al-Ahrar», observou com ironia: «Como é maravilhoso o regresso à nossa pátria; no entanto, quão difícil é esse regresso sob as baionetas israelitas e a sombra da ocupação sionista». M.S.L.
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