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<DOCNO>PUBLICO-19940723-048</DOCNO>
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<DATE>19940723</DATE>
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Críticas aumentam com as vendas
O CD-ROM (ainda) não é uma torradeira
Pedro Fonseca
No fim deste ano, haverá mais 12 a 16 milhões de unidades de leitura de CD-ROM a serem usadas em todo o mundo. É um mercado em franca expansão, onde, com o crescimento das vendas, aumentam as reclamações. Porque, quando se executa o comando para aceder aos dados do pequeno disco compacto, tem-se que esperar alguns segundos -- o que é muito para quem está habituado a fazer um «clique» e a obter uma resposta imediata do computador. Mas, não obstante as deficiências tecnológicas, o CD-ROM é um suporte digital com futuro na educação, na música e, principalmente, nos jogos.
As previsões falam de 12 a 16 milhões de unidades de CD-ROM instaladas este ano, o que significa o dobro das vendas efectuadas em 1993. A venda do «software» aumentará de mais de 1500 milhões para 3700 milhões de dólares no mesmo intervalo de tempo e, no próximo Natal, serão lançados 1700 novos títulos. Os números até nem são gigantescos se os compararmos com os 24 milhões de lares norte-americanas que têm computadores pessoais e os 34 milhões com consolas da Nintendo. Mas, se lembrarmos que, ainda há dois anos, não era usual ter um CD-ROM, que muitas empresas de diversos domínios estão a entrar em força neste meio e que a maior parte dos sistemas de vídeojogos estão progressivamente a utilizá-lo, o CD-ROM pode considerar-se uma aposta prometedora -- depois de eliminados alguns obstáculos.
Apresentado em Novembro de 1985, o CD-ROM é um disco compacto (descendente do CD áudio surgido sete anos antes) que armazena imagens de vídeo, som e dados informáticos e é lido através de uma unidade de leitura acoplada ao computador. Desenvolvido pela Philips e Sony, constitui um suporte normalizado e um bom meio de difusão de grandes quantidades de informação, possibilitando alguma interactividade mas... tempos de acesso demorados.
Esta é a queixa usualmente mais ouvida pelo cada vez maior número de consumidores dos CD-ROM: o tempo de espera necessário para que uma operação seja executada. Veja-se o exemplo de um jogo: como a informação no disco não está guardada sequencialmente, quando o utilizador passa de um nível para outro ou para um dos pequenos vídeos incorporados na obra, é necessário que o feixe de laser que faz a leitura dos dados se movimente e posicione onde os dados estão guardados e os envie para o computador. Este tempo de acesso de alguns segundos é um momento de espera para o utilizador, habituado a ter uma operação rapidamente executada no computador.
Embora se trate de uma tecnologia recente, com óbvias limitações e a necessitar de aperfeiçoamentos, o CD-ROM sofre também por não ter transitado pelos processos tradicionais antes da entrada no mercado. De modo inverso ao ocorrido com os leitores ou os gravadores de vídeo, o CD-ROM não foi testado intensivamente e criticado por utilizadores profissionais, e caiu de forma rápida na mão dos consumidores -- para quem, após o fascínio da novidade, se segue agora alguma frustração.
As causas são diversas, desde o tempo de espera à baixa qualidade de alguns discos e à complexidade da instalação nos computadores pessoais (embora nos Macintosh seja menos difícil). Como se apontava no «Wall Street Journal», acredita-se que «as pessoas não estão satisfeitas com 50 por cento do `software' em CD» e davam o exemplo do médico Arthur Berman. Este pagou 295 dólares pelo GenRx, um programa de referências de medicamentos editado pela Denniston Publishing, vindo a descobrir que «é mais rápido utilizar um livro» para obter a mesma informação. Resultados preliminares dum inquérito efectuado pela Dataquest apontavam que cerca de 43 por cento de 300 consumidores contactados não pensavam comprar mais qualquer título de «software» para além dos que eram oferecidos na compra da unidade de leitura dos discos.
Muitas destas unidades de leitura foram adaptadas posteriormente à compra dos computadores através de «upgrade kits» e colocam alguns problemas na personalização do sistema, nomeadamente com as expansões de memória. As frustrações abarcam ainda a incompatibilidade do «software» com o computador, a grande necessidade de memória para certos programas ou a fraca qualidade das imagens vídeo. É óbvio que alguns destes problemas são facilmente resolvidos por quem tenha alguns conhecimentos de informática. Mas, para quem não os tem (e são muitos), os CD-ROM deveriam ser «como uma torradeira»: deverá ser possível «ligá-la e ela funcionar», exemplificava Warren Bucklitner, editor da «newsletter» «Children's Software Revue».
Novos avanços...
Algumas destas queixas serão, em breve, solucionadas com o surgimento de microprocessadores mais rápidos ou com a disseminação dos novos leitores de CD-ROM que duplicam a velocidade de acesso aos dados. A 3DO, empresa californiana criadora dum novo «standard» de videojogos, declara ter ultrapassado esse obstáculo ao conseguir duplicar a velocidade actual dos discos para 500 rotações por minuto.
Não admira que os avanços tecnológicos surjam da indústria dos vídeojogos. Nos Estados Unidos, as previsões apontam para um declínio na venda de consolas de jogos já em 1994 (o primeiro trimestre deste ano foi um dos piores para os fabricantes), que se acelerará no próximo ano. Dos oito milhões de unidades comercializadas em 1992 e dos nove milhões em 1993, passar-se-á para seis a sete milhões neste ano e apenas três milhões em 1995.
A tendência emergente é lançar jogos para computadores pessoais e em CD-ROM. Este suporte é o responsável pela maior quota dos 30 por cento de crescimento anual na indústria dos vídeojogos, depois de muitas empresas terem apostado nos discos compactos. É o caso da Philips, responsável pelo disco compacto interactivo (CD-I), da Sega (com o Mega CD), Commodore e a consola CD32, o projecto Jaguar da Atari, o PS-X da Sony, e de inúmeras «software houses» a desenvolverem jogos para computadores pessoais.
Para já, só a Nintendo não quer nada com este suporte. O fabricante japonês quer manter-se nos cartuchos de jogos, por serem cem vezes mais rápidos o que os discos de alta velocidade, e afirma que a sua «arma secreta» a ajudará a resistir à mudança. Trata-se do projecto Reality, agora denominado Ultra 64, e une a Nintendo ao fabricante de estações de trabalho Silicon Graphics, cotada pelos seus sistemas gráficos de alta qualidade. O lançamento comercial ocorrerá apenas em 1995.
Perante a atitude prudente da Nintendo, o outro gigante dos vídeojogos contrapõe um forte empenho nos discos compactos. A Sega lançará, no final do ano, o resultado do projecto Mars, que adoptará o nome comercial de Genesis Super 32X nos Estados Unidos, um sistema de maior qualidade gráfica (utilizando 32 bits em vez dos 16 actuais) e que aumentará as capacidades do Mega CD. Paralelamente, apoiou financeiramente a nova empresa Rocket Science Games a desenvolver uma nova tecnologia (de que não são conhecidos quaisquer detalhes) mas que anunciam irá tornar os CD-ROM dez vezes mais rápidos, ao apostar numa organização sequencial dos níveis de informação. Os dois primeiros produtos (os jogos Loadstar: The Legend of Tully Bodine e Cadillacs and Dinosaurus) são lançados no Outono e só então se saberá da sua real capacidade.
Do lado de Hollywood, a indústria cinematográfica entendeu o potencial do novo suporte, nem que seja pelo alerta dado pelas deserções de alguns técnicos e actores contratados para participar nos novos «filmes interactivos». George Lucas e Steven Spielberg, os pais da trilogia «Guerra das Estrelas», vão editar no próximo ano The Dig, um jogo espacial em CD-ROM. Sozinho, Spielberg investiu na Knowledge Adventure, uma empresa de «edutainment» -- «software» que combina ensino com entretenimento. Em 8 de Junho, o realizador anunciou que vai colaborar numa série de jogos para esta companhia.
Hollywood na corrida
Hollywood compreendeu também as mais-valias que pode gerar o controlo sobre os milhares de filmes realizados desde há décadas. A «reciclagem» de filmes antigos ou a adaptação simultânea de novos filmes ao suporte digital pode trazer-lhe benefícios financeiros. Para isso, tem ainda que simplificar o problema dos direitos autorais. Num recente caso, a empresa Total Clearance tentou obter autorização para usar cinco segundos de imagens da «Guerra das Estrelas» e teve que conseguir a permissão do realizador, dos actores, dos duplos, dos coordenadores destes, da editora musical, dos autores do argumento e dos detentores dos direitos globais da obra.
Um outro exemplo da integração de meios tradicionais no novo suporte é a atraente história interactiva em 15 capítulos «Ursa minor Blue», vencedora do prémio especial da cidade de Montreux, no festival internacional de cinema electrónico (Montreux, 1993) (ver figura). Concebida por Shigeru Tamura num Macintosh, usando o sistema de vídeo de alta definição da Sony, foi editada originalmente em livro, com 68 ilustrações, e em filme de 35 mm e vídeo de alta definição, ambos com 23 minutos.
Mas há ainda quem veja o CD-ROM como algo pouco atractivo. É o caso da indústria musical, que, embora tenha lançado alguns títulos -- de que o mais conhecido será o «Xplora», de Peter Gabriel --, não acredita que ele seja viável financeiramente, tanto para as editoras como para os consumidores. Adiantam que só compradores com mais de 28 anos têm um leitor de CD-ROM e podem gastar 50 dólares (oito mil escudos) num álbum interactivo, enquanto o seu mercado potencial é mais jovem.
Do ponto de vista artístico, muitos músicos não estão interessados no suporte interactivo e, no caso da Sony, é a própria editora que não pensa, «de momento», no lançamento de títulos. O investimento é grande e as vendas reduzidas. Para David Bowie concretizar o seu disco interactivo «Jump», despendeu cerca de 500 mil dólares. O material sonoro é originário do disco tradicional «Black Tie, White Noise», que custou apenas cerca de 200 mil dólares (cerca de 33 mil contos).
David Pullen, responsável pela divisão «multimedia» da editora BMG Records, refere ainda a demora: «Cerca de 12 a 15 meses para produzir o CD-ROM, a partir do momento em que tivemos a `storyboard'» finalizada.» O lançamento do CD-ROM ocorreu com mais de um ano de diferença sobre o disco original e sem nenhum novo material. Prince torneou este problema lançando o CD-ROM «Interactive», com algumas músicas e vídeos criados propositadamente para a obra.
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