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<DOCNO>PUBLICO-19940823-056</DOCNO>
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<DATE>19940823</DATE>
<CATEGORY>Local</CATEGORY>
<AUTHOR>GP</AUTHOR>
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Há 30 anos por acabar em Évora
Hospital do Patrocínio pode estar concluído em breve
Luís Rocha
Os eborenses habituaram-se a chamar ao Hospital do Patrocínio as «obras de Santa Engrácia». É que a unidade começou a ser construída há mais de três décadas, mas, ainda hoje, depois de muitas promessas oficiais e hesitações quanto à sua finalidade, continua por acabar.
Paulo Mendo, ministro da Saúde, esteve há dias em Évora e disse que o Hospital do Patrocínio será concluído e vai funcionar como unidade de apoio ao hospital distrital e como centro de rastreio oncológico. O edifício está praticamente terminado por fora, mas por dentro falta fazer quase tudo. E na cidade, mais de 30 anos volvidos sobre o início das obras, já ninguém acredita que ele venha a ficar pronto.
A história do Hospital do Patrocínio começa na década de 50, quando se constituiu em Évora a Fundação do Patrocínio, que tinha como objectivo a construção de um centro de investigação oncológica. A ideia partiu do engenheiro Eugénio de Almeida, um dos maiores proprietários rurais da região, que doou cinco mil contos. Foi feita uma subscrição pública, que rendeu mais mil contos e materiais de construção. Com este capital inicial a fundação avançou para a construção de um edifício próximo do hospital distrital. As obras duraram enquanto houve dinheiro. Depois, ficou um «esqueleto» em tijolo, à espera que alguém se decidisse a financiar a sua conclusão.
Com o passar dos anos, a área construída foi-se degradando e quando, em 1977, o então ministro da Saúde, António Arnault, se deslocou a Évora para resolver a questão do Hospital do Patrocínio, fizeram-se reuniões com as diversas entidades. Só que a instalação em Évora de uma unidade oncológica exigia verbas elevadas não só em equipamentos, como em pessoal especializado. Depois, implantada na cidade uma unidade desse tipo, era provável que as outras capitais de distrito reivindicassem uma estrutura de saúde semelhante.
O ministro sugeriu que se entregasse o caso a uma equipa de juristas que tentaria encontrar uma alternativa para o problema levantado pelos estatutos da fundação que previam a construção de uma unidade oncológica. Após um longo trabalho, foi decidido integrar a estrutura de tijolo do Hospital do Patrocínio no Hospital Distrital de Évora. A escritura foi celebrada em 20 de Abril de 1980, e tudo o que pertencia ao Hospital do Patrocínio foi integrado no hospital distrital. A Fundação do Patrocínio foi extinta e, em termos legais, o hospital deixou de existir.
Por indicação do Ministério da Saúde, foi então constituído um grupo de trabalho que elaborou um novo programa do Hospital Distrital de Évora, distribuindo os serviços de apoio pelas instalações existentes e pelas do extinto Hospital do Patrocínio, cujas obras ainda não tinham sido concluídas. Em Dezembro de 1984 no plano do Ministério da Saúde foi inscrita uma verba de 725 mil contos para conclusão das obras do Patrocínio. Esse dinheiro deveria ser entregue em anualidades de 145 mil contos. Só que, dois anos mais tarde, ainda não chegara qualquer montante.
Na discussão do Orçamento de Estado para aquele ano, por proposta de um deputado do PCP, foi destinada a verba de 70 mil contos para início das obras do Patrocínio. Simplesmente, quando os responsáveis hospitalares quiseram receber o dinheiro, não chegaram a levantá-lo porque a Fundação do Patrocínio já não existia. Tinha sido extinta em 1980. Como o dinheiro não veio, a estrutura de tijolo lá ficou tal como estava.
Em Setembro de 1986, a ministra Leonor Beleza deslocou-se a Évora e, nas instalações do Governo Civil, fez a entrega do Hospital do Patrocínio -- que, em termos legais, não existia -- à Santa Casa da Misericórdia. Segundo o acordo então celebrado, o Ministério da Saúde obrigava-se a fazer as obras de acabamento e a garantir a estabilidade financeira e a normal administração da unidade hospitalar. A Misericórdia apenas explorava a nova estrutura de saúde, que deveria integrar uma unidade de rastreio de cancro, uma unidade para idosos dependentes e uma clínica privada.
O então director do Hospital Distrital de Évora -- que, na altura, era membro destacado do PSD local -- pôs o caso em tribunal. A ministra demitiu-o e nomeou outro médico para o lugar, o qual tratou de retirar a queixa.
A partir daqui, o dinheiro começou a aparecer, as obras reiniciaram-se e tudo indicava que o Hospital do Patrocínio iria, enfim, ser concluído. Mas não foi. Com a demissão do ex-secretário de Estado Costa Freire o dinheiro voltou a faltar e as obras foram de novo interrompidas.
Em Abril de 1990, o Ministério da Saúde, então liderado por Arlindo de Carvalho, nomeou uma comissão que foi incumbida de elaborar um relatório sobre a viabilidade de conclusão das obras do Patrocínio. Constituíam essa comissão um assessor do ministro, um representante do Ministério do Emprego e Segurança Social, o presidente do Centro Regional de Segurança Social de Évora e o provedor da Misericórdia local; dela estavam ausentes a então Direcção Regional de Saúde e representantes do hospital distrital.
Surgiram divergências entre o Governo e a Santa Casa da Misericórdia, com esta entidade a exigir que o protocolo que assinara com Leonor Beleza fosse respeitado. As divergências chegaram ao ponto de Vítor Melícias, presidente da associação das Misericórdias do país, vir à televisão dizer que, no caso, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa dava todo o apoio à sua congénere de Évora. E as obras voltaram a parar. Há mesmo quem apelide a edificação do hospital de «obras de Santa Engrácia», as que «nunca mais têm fim».
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