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<DOCNO>PUBLICO-19950128-187</DOCNO>
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<DATE>19950128</DATE>
<CATEGORY>Cultura</CATEGORY>
<AUTHOR>MSL</AUTHOR>
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Amos Oz: «Divórcio justo entre israelitas e palestinianos»
Margarida Santos Lopes e Torcato Sepúlveda
Amos Oz, reconhecido como um dos mais importantes escritores israelitas e fundador do Movimento Paz Agora, diz que o seu povo e os palestinianos têm de aceitar um «divórcio justo». Não podem viver juntos e felizes. Não podem partilhar a mesma terra. Têm de a dividir. O conflito de ambos -- entre duas nações, e não entre duas etnias ou religiões -- pode ter um fim à Shakespeare, em que todos morrem, ou um fim à Tchekov, onde todos ficam frustrados, mas vivos. Ele prefere as personagens tchekovianas, tal como Fima, o elemento central do seu romance «A Terceira Condição», que veio lançar a Portugal. Um homem que carrega a culpa do mundo sem ter sentido o prazer do pecado. Um homem que não é inocente, mas que busca a inocência. Um homem bom que não sabe fazer o bem. O terceiro livro de Oz publicado em português é também um tributo de Amos Oz a seu pai. Mais uma história de família e uma metáfora da sociedade israelita.
Chegou bem-disposto e sorridente, não obstante a longa viagem que o trouxe de Arad, a terra onde vive, entre os desertos do Negev e da Judeia, até Lisboa. Apesar do visível cansaço, os seus olhos azul-turquesa mantiveram-se serenos. Pediu um café e acendeu um cigarro com as mãos rugosas de quase 30 anos de trabalho na cozinha e campos de algodão de um «kibbutz». Avisou que era preciso fazer uma distinção entre a sua análise política e a sua obra literária: «Uso sempre canetas diferentes, uma para os romances e outra para os ensaios.» Depois começou a falar pausadamente, sempre atento aos «flashes» da máquina fotográfica. Ele sabe que é um sedutor.
Chamam-lhe «o símbolo da literatura contemporânea israelita», mas o sucesso não subiu à cabeça de Amos Oz, o filho Yehuda Arieh Klausman, um professor forçado pelo anti-semitismo na Europa a emigrar para a Palestina no princípio dos anos 30. Amos é um homem simples, apesar de receber telefonemas do primeiro-ministro de Israel a pedir-lhe conselhos ou de os seus livros serem lidos avidamente como comunicados públicos. Os políticos e os jornalistas batem-lhe à porta e acorrem a ouvi-lo, porque é uma voz dissidente, mas leal, da sociedade israelita.
Amos é um pacifista que foi duas vezes para o campo de batalha, na convicção de que «o mal fundamental não é a guerra em si, mas a agressão». Em 1977, fundou com outros intelectuais o Shalom Ashav (A Paz Agora), um movimento que é «a expressão dos aspectos humanistas do sionismo e do carácter universalista do judaísmo», porque «a Cisjordânia e Gaza não são o Vietname e o Afeganistão, Israel não é a África do Sul e o conflito israelo-árabe não tem nada a ver com as guerras imperialistas e coloniais».
Sionista de esquerda, Amos saiu de casa aos 14 anos e mudou o apelido de Klausman para Oz («força», em hebraico), porque não concordava com o «sionismo de direita e não crítico» do seu pai. E, no entanto, «A Terceira Condição» é um tributo ao pai, que adorava livros e que guardava bombas nas estantes, para ajudar a resistência judaica na luta pela independência.
«Quando o meu pai era vivo, embora não tivéssemos a melhor das relações, havia o seu corpo, a sua pessoa -- as suas costas largas, por assim dizer --, erguidos entre mim e a morte. Quando ele morreu, não havia nada. A morte de um familiar [...] deixa cada um preparado para a sua vez».
PÚBLICO -- Neste romance, «A Terceira Condição», há mais uma vez uma história de família, tal como em «A Caixa Negra». Podemos compreender esta família como uma metáfora da sociedade de Israel?
AMOS OZ -- Se eu tivesse que descrever o objecto de todos meus romances, em traços largos, diria que escrevo sobre famílias. Para mim, as famílias não são apenas metáforas para a sociedade em geral, mas elas próprias são misteriosas instituições, que sobreviveram a tantas e tão diferentes religiões, ideologias, períodos de tempo e civilizações. Toda a gente previu a extinção da família tradicional e, no entanto, os profetas estão mortos e as famílias continuam vivas. Por isso, a compreensão do conflito de uma sociedade começa sempre com uma certa dimensão familiar.
Por exemplo, há muito tempo que falo da necessidade de israelitas e palestinianos aceitarem um divórcio justo. Não uma lua-de-mel. Não um casamento. Não um romance, mas um divórcio. Um divórcio baseado num compromisso. Mas este será um divórcio muito engraçado, porque as duas partes divorciadas vão permanecer no mesmo apartamento. E é necessário decidir quem vai ficar com o quarto A e quem fica com o quarto B. E como o apartamento é muito pequeno, teremos que chegar a um acordo sobre o espaço na cozinha e na casa-de-banho.
Israelitas e palestinianos não podem viver felizes juntos. Depois de 100 anos de ódio e conflito, nenhuma das partes se vai embora. Não podem partilhar a terra; vão ter de a dividir traçando uma linha. Creio que, um dia, depois do divórcio, será possível às duas partes encontrarem-se e tomar café juntos. Um dia, talvez, até poderão rir juntos sobre a sua estupidez no passado, mas agora o que eles precisam é de um divórcio. E muitas pessoas na Europa não compreendem isto.
Culpa e prazer do pecado
P. -- Neste livro, «A Terceira Condição», a personagem principal trabalha numa clínica de abortos. É como se a morte planasse sobre todas as personagens. É também uma metáfora?
R. -- De certo modo, mas não é uma metáfora política. A principal personagem, Fima, está obcecada pela política, mas o romance não é sobre política e sim sobre obsessão. Não tento transmitir nenhuma mensagem política. Tento descrever a obsessão da culpa. Fima é um homem que se sente responsável e culpado por tudo o que acontece.
P. -- Fima é como uma personagem de um filme de Woody Allen, um pouco perdido, um pouco louco, um pouco inocente. Será que o futuro de Israel está nessa inocência?
R. -- Essa similaridade tem a ver com as raízes comuns na literatura russa do século XIX. Fima tem os ideais de Tolstoi, mas é um tolstoiano saído de um romance de Dostoievski. É também tão ocioso como Oblomov e tão desamparado como uma personagem de Tchekov. Há muito da Rússia do século XIX em Fima.
P. -- Mas Fima é, de certa maneira, o contrário das personagens de «A Caixa Negra», que são maquiavélicas. É como se tivesse retornado a uma certa inocência. Ou como se procurasse essa inocência.
R. -- Eu procuro uma certa inocência neste romance, mas é claro que ela não pode ser encontrada em Fima. Fima não é inocente. Casou-se, divorciou-se da mulher que amava e agora ama de novo. Tenta ser o pai de um filho que não é o dele. Ele procura a inocência, mas não é inocente.
Amar as mulheres sem fazer amor
P. -- O pai de Fima parece-se muito com o seu.
R. -- O pai de Fima é uma combinação do meu pai e do meu avô. O meu avô era um mulherengo ao estilo do século XIX. Beijava a mão das senhoras e mandava-lhes caixas de chocolates. Toda a vida foi admirado e amado pelas mulheres. Mas não teve uma relação especial com nenhuma mulher em particular. O meu pai era muito direitista, em termos políticos, tal como o pai de Fima. Repare, Fima e o seu pai são muito semelhantes em alguns aspectos. Ambos têm relações com muitas mulheres, mas não uma relação estável com uma só mulher. Ambos estão mais interessados em estar com as mulheres do que em fazer sexo. Na verdade, não são muito bons em sexo.
P. -- É então um libertário, como os libertários franceses do século XVIII, por exemplo, como Casanova, que amam as mulheres mas não o amor.
R. -- É verdade. Eles amam as mulheres mais do que fazer amor. No entanto, Fima e o pai são pessoas muito generosas, que gostam de dar. Não sabem muito bem ouvir, mas falam muito. Há muitas coisas que Fima e o pai têm em comum. Só que o pai é feliz e Fima não.
P. -- Porquê?
R. -- O pai nunca se sente culpado, enquanto Fima tende a carregar a culpa do mundo inteiro sobre os seus ombros. A culpa foi inventada em Jerusalém pelos judeus. Não tenho orgulho nisso. Mais tarde os cristãos espalharam-na pelo mundo, mas a culpa foi inventada em Jerusalém. E Fima é o tipo de homem que se não se sentir culpado durante um dia inteiro, à noite sentir-se-á terrivelmente culpado por não se ter sentido culpado durante o dia. Compreende? Ele sofre as agonias da culpa sem ter gozado primeiro o prazer do pecado. Do seu jeito, ele é um profeta menor. É engraçado, mas os profetas são engraçados. Ele assumiu uma responsabilidade, tal como os profetas. Por isso, numa certa dimensão, esta é uma comédia teológica.
Oh, Saramago!
P. -- Há um escritor português que escreveu um livro sobre Cristo...
R. -- Oh, Saramago! Li é claro!...
P. -- ... e ele dizia que, nessa região, os profetas se cruzavam como se estivessem numa auto-estrada.
R. -- É verdade. Vladimir Nabokov escreveu um maravilhoso ensaio sobre Tchekov num livro chamado «Lectures on Russian Literature». Neste livro ele diz que as personagens de Tchekov são gente boa que não consegue fazer o bem. São pessoas que estão sempre a tropeçar porque têm os olhos fixos no céu. É o caso de Fima.
P. -- Quando lemos este livro, ficamos surpreendidos com o fim. É como se acabasse abruptamente.
R. -- No final do romance, Fima senta-se na cadeira do pai. É fim-de-semana, o pai morre na sexta-feira, no dia seguinte é sábado, mas na próxima semana ele tem de ir para a fábrica. Vai ter de tratar das contas, dos trabalhadores, das exportações de cosméticos. Será que vai sobreviver a isso? Não sabemos. O fim do livro fica em aberto. Fima é um adolescente de 55 anos. Quando o pai morre, é tempo de descobrir se consegue fazer alguma coisa da sua vida. Sim ou não. E eu quis que isto ficasse em aberto.
P. -- Entre este livro e «A Caixa Negra», há uma evolução para uma certa forma de optimismo. Isto é, as personagens de «A Caixa Negra» eram horríveis, mas aqui há uma espécie de amor que nos envolve.
R. -- Sim, sim. Toda a gente em «A Caixa Negra» quer ser o outro. Todas as personagens não só querem as outras, como as querem dominar e fundir-se. Em «A Terceira Condição», Fima quer ser aquele que cura todas as feridas, especialmente as feridas que outros causaram. Em «A Caixa negra» são todos fanáticos. Em «A Terceira Condição», Fima tem uma obsessão contra o fanatismo.
Holocausto e poder físico
P. -- Uma outra questão é o título. Em português é «A Terceira Condição», mas em francês é «La Troisième Sphère», o que nos transporta a um conceito cabalístico.
R. -- O conceito de «A Terceira Condição» é um conceito cabalístico. É uma ideia, o sonho de um mundo onde não haverá necessidade de tomar decisões, onde todas as contradições, conflitos e contrastes não são resolvidos, mas harmonizados. Se perguntarmos a Fima o que ele quer para o pequeno-almoço, doce de laranja ou arenque, ele agonizará por algum tempo, porque arenque é bom, doce de laranja é bom, e não quer ofender ninguém. Acabará, talvez, por pedir arenque barrado com doce de laranja.
P. -- O escritor A. B. Yehoshua disse uma vez que todos os judeus do mundo deveriam retornar a Israel. Se o país não for suficientemente grande, «constrói-se em altura». Isso surpreende, ainda mais porque, segundo ele, uma das razões do holocausto foi a diáspora. Que pensa disto?
R. -- Israel deve ser uma opção para todos os judeus, não necessariamente um dever. Todos os judeus que se sentem perseguidos por serem judeus devem saber que Israel pode ser uma esperança. Israel deve ser uma inspiração para todos os judeus, mas se os judeus preferem viver em Nova Iorque ou em Estocolmo, a decisão é deles. O que eu quero é que Israel seja uma fonte de energia cultural, intelectual e emocional do povo judeu, mas também um abrigo se vierem tempos maus. Não digo que o holocausto foi um resultado da diáspora. Não creio que esteja certo perguntar o que há de errado com os judeus. O que está certo é perguntar o que há de errado com as pessoas que matam judeus. Não creio que os judeus sejam culpados pelo holocausto, mas sim os assassinos dos judeus.
P. -- Israel é hoje um lugar seguro?
R. -- Não, não é seguro. Mas num aspecto é mais seguro do que qualquer outro lugar. Porque em Israel, se algo terrível acontecer com os judeus, será, em parte, responsabilidade deles. Em Israel já não serão vítimas passivas. Na diáspora, os judeus vivem numa cadeira de rodas. Pela primeira vez na nossa história, é precisamente em Israel que podemos perguntar o que há de errado connosco e não apenas o que há de errado com os nossos inimigos.
P. -- E qual é a resposta?
R. -- Estamos a sofrer o síndroma da intoxicação do poder. Durante dois mil anos, os judeus não tiveram poder físico, apenas o poder do saber, do intelecto, da sobrevivência. Quando finalmente se tem o poder físico é compreensível que se fique um pouco embriagado. Aconteceu com alguns israelitas, não todos. Ficaram intoxicados com o poder do poder. Não digo que não precisamos de poder. É claro que precisamos! Mas temos de usar o poder de forma sóbria, realista e pragmática. A euforia do poder é perigosa.
Jerusalém polifónica
P. -- Agora em Israel fala-se muito em «separação», mas enquanto alguns israelitas receiam que seja o primeiro passo para um Estado independente palestiniano, os palestinianos entendem isso como uma prisão.
R. -- Creio que um pequeno país, que nós chamamos Israel e eles chamam Palestina, deve ser dividido em dois Estados, soberanos e independentes.
P. -- Como é que divide a «cozinha e a casa-de-banho»?
R. -- No essencial, será uma divisão ao longo de linhas demográficas. Onde existe uma maioria de população palestiniana, deve ser a Palestina; onde existe uma maioria de judeus israelitas, deve ser Israel. Haverá certamente palestinianos a viver em Israel e israelitas a viver na Palestina. É sobretudo muito importante que as duas partes compreendam que este é um conflito internacional. Não é um conflito étnico ou religioso. Nem uma luta de classes entre pobres e ricos. É um conflito internacional entre duas nações e tem de ser resolvido numa base internacional.
É claro que Jerusalém é uma questão complicada. Não creio que Jerusalém deva ser dividida por muros, minas e arame farpado. Isso seria um desastre. Mas creio que todos os cidadãos de Jerusalém devem ter a liberdade de escolher o seu passaporte e nacionalidade. E creio que Jerusalém pode ser governada por meia dúzia de submunicípios. Não apenas dois, judeu e árabe, mas meia dúzia que reflictam a pluralidade de Jerusalém. Com um pouco de imaginação, Jerusalém pode vir a ser uma cidade polifónica, não fisicamente dividida.
P. -- Como se podem controlar os fanáticos que tentam destruir o processo de paz?
R. -- Não creio que possamos fazer desaparecer o fanatismo. O chauvinismo e fanatismo religioso estão a aumentar, no islão, no cristianismo e, infelizmente, até no judaísmo.
Também há judeus maus
P. -- Em «A Terceira Condição», há um capítulo intitulado «Vergonha e Culpa», onde uma personagem diz que após o holocausto nada ficou igual, nem mesmo os judeus, que a culpa caiu sobre eles também.
R. -- Já disse muitas vezes que é errado pensar que, por causa do holocausto, os judeus se tornaram anjos. Seria errado pensar que, tendo os judeus passado pelo inferno, não podem causar mal a outros. Há vários tipos de judeus: bons, maus, cruéis, estúpidos, tal como os outros. Mas voltando à outra questão, creio que todos nós, israelitas e palestinianos, temos de criar esperança, porque onde há esperança há menos fanatismo. O senhor Arafat terá de decidir muito em breve se quer fazer a paz com Israel ou com o Hamas. Ele não pode fazer a paz com os dois. Israel não pode conter ou suprimir os fanáticos palestinianos, só os palestinianos o podem fazer.
P. -- Mas Arafat, para a gente do Hamas, é também um inimigo. Além disso, durante 30 anos, Israel com um Exército poderoso e melhor armado não foi capaz de conter os extremistas, como pode Arafat com menos meios fazer o que os israelitas não fizeram?
R. -- Não é uma questão de quantas armas. Só a sociedade palestiniana, como sociedade e não como exército ou polícia, pode conter o Hamas.
P. -- O Corão permite aos muçulmanos matar os seus inimigos.
R. -- O Corão, tal como outros livros religiosos, pode ser interpretado de maneiras diferentes. Se a interpretação fanática do Corão prevalecer, não haverá paz. Se a interpretação mais sofisticada prevalecer, então a coexistência é possível. A escolha cabe exclusivamente à sociedade muçulmana. Não há compromisso possível entre Israel e o Hamas ou o Hezbollah.
Pragmáticos e fanáticos
P. -- Mas Israel também é responsável pela força do Hamas.
R. -- Sim, concordo. Fomos muito lentos a compreender as mudanças na sociedade árabe e as aspirações da sociedade palestiniana. Se Israel tivesse adoptado a política actual há 20 ou 30 anos, talvez fosse mais fácil. É como uma ferida que já deveria ter sido sarada há muito tempo. Parte da culpa é nossa, mas não toda. Mesmo sujeitas ao sofrimento, opressão e injustiça, as pessoas têm de ser capazes de escolher entre soluções pragmáticas e soluções fanáticas.
P. -- Talvez Israel também não tenha um povo pragmático, mas fanáticos de Deus. E então?
R. -- A maioria dos israelitas são pessoas pragmáticas. Mas é possível que extremistas árabes e fanáticos palestinianos empurrem a sociedade israelita para o fanatismo. Nenhuma sociedade está imune a isto. Na tradição ocidental, a palavra compromisso soa como uma palavra feia. Muitas pessoas dizem que compromisso é falta de princípios. Para mim, a palavra compromisso significa vida. A alternativa ao compromisso é a morte. E compromisso significa que ninguém pode ter tudo o que sonhou. É impossível.
Arafat não é Ho Chi Minh
P. -- Depois do mais recente ataque do Hamas, houve muitas vozes em Israel a pedir a suspensão das negociações com os palestinianos. No entanto, quando o acordo de paz foi assinado, toda a gente previu que os extremistas iriam fazer tudo para o destruir. Como explica esta reacção?
R. -- As pessoas estão desapontadas. Muitos ainda não compreenderam que se pode causar uma ferida num segundo, mas que são precisas semanas ou meses para a curar. Estamos a tentar sarar uma ferida profunda. Não estou a sugerir que Israel deva dar a outra face. Nunca disse isso. Creio que Israel deve fazer todos os possíveis para combater o Hamas, o Hezbollah e a Jihad Islâmica, onde quer que eles estejam. Mas ao mesmo tempo não devemos suspender o processo de paz, porque será um triunfo para os fanáticos.
Ora, há duas maneiras de conduzir um processo de paz. Ou conversamos e não disparamos; ou conversamos e disparamos. Israel vai ter de ripostar, mas negociar sempre. As negociações são a nossa única esperança. Não podemos escolher os nossos inimigos. Eu quero fazer a paz com os palestinianos, não porque eles são amorosos, mas porque são o meu inimigo. Não sou nenhuma Jane Fonda e Arafat não é o meu Ho Chi Minh. Não me interessam beijos e abraços. Muitas vezes confunde-se paz com amor, reconciliação, irmandade e compaixão. Estas palavras não são sinónimos. O oposto de guerra não é amor. É paz. Por isso o meu lema em relação aos palestinianos é «Façam paz e não amor».
P. -- Depois de tantos anos de violência e guerras, estão os israelitas preparados para ter uma vida «normal»?
R. -- Sabe? É uma velha tradição judaica responder a uma pergunta com uma pergunta. Que alternativa temos nós, a não ser procurar a paz? Seja fácil ou difícil, é o nosso destino. A alternativa à paz é a morte. E uma paz má é melhor do que uma guerra maravilhosa.
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