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<DOCNO>PUBLICO-19950203-046</DOCNO>
<DOCID>PUBLICO-19950203-046</DOCID>
<DATE>19950203</DATE>
<CATEGORY>Economia</CATEGORY>
<AUTHOR>JSBR</AUTHOR>
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Assembleia de credores reúne hoje
Instabilidade pode voltar à Pereira Roldão
A instabilidade social poderá regressar hoje à Marinha Grande, caso a assembleia de credores da Manuel Pereira Roldão (MPR) aprove uma resolução contrária aos desejos manifestados pelos trabalhadores.
Na assembleia, o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Vidreira (STIV), enquanto representante dos trabalhadores e credores, vai pedir ao juíz a nomeação de um administrador judicial para a empresa e a convocação de uma outra assembleia para finais de Março onde se pedirá o afastamento compulsivo dos actuais accionistas da MPR (a 22 de Abril próximo, recorde-se, termina o prazo de gestão controlada da vidreira, de acordo com o decreto-lei 177/86 sobre as empresas em situação económica difícil).
Durval Gaspar, dirigente do STIV, afirmou ontem ao PÚBLICO que «há riscos de haver mais sarrabulho», tudo dependendo da decisão do juíz, e acrescentou que os «trabalhadores estão com uma vontade muito grande de lutar pela empresa e estão dispostos a voltar à luta» se tal se revelar necessário.
Se bem que sejam os trabalhadores a liderar o processo, a principal palavra entre os credores será dada pela Segurança Social, a quem cabe cerca de 73 por cento da dívida da empresa (mais de dois milhões de contos, ao abrigo do decreto-lei 117/86, ou mais de 3,2 milhões de contos, se se excluir o decreto). Para a reunião de hoje, a Segurança Social «não inviabilizará qualquer proposta, desde que ela seja aceite pelo juíz», conforme sublinhou um responsável ligado a este processo.
O principal sócio da MPR, Carlos Antero, declara que não se oporá à nomeação de um administrador judicial e que a ocorrer essa nomeação, «ela passará por uma proposta nossa [dos sócios-gerentes da empresa], mas sempre dentro do quadro legal». Referiu ainda que espera da reunião de hoje um «debate de ideias construtivo» e que se encontre uma «solução exequível». De qualquer forma, sublinhou que a «única entidade que conhece profundamente a empresa e o seu valor somos nós» e que aceita uma gestão desde que caiba aos actuais administradores o direito de «escolher os novos gestores» -- já que continuam a ser os proprietários da empresa e porque estão concentrados na reestruturação, que «é a única solução para o futuro da empresa».
Ignora-se ainda qual o lado da balança para que penderá o juíz, embora se creia que este opte por esperar até 22 de Abril para tomar uma posição definitiva, «dando assim tempo para se encontrar um comprador credível para a vidreira».
Uma questão que pode afectar o futuro imediato da unidade fabril tem a ver com o facto de um dos gestores actuais ter sido imposto pela Câmara Municipal da Marinha Grande no âmbito do aval que concedeu à MPR, em troca de um terreno, para esta ter dinheiro para o pagamento de salários em atraso e para dispor de algum fundo de maneio quando reiniciou a laboração. Os dois principais accionistas da empresa, Carlos Antero e Azevedo Coutinho, assinaram duas procurações, uma para que Fernando Rela, indigitado pelo Município da Marinha Grande, gerisse a unidade, e outra para idêntica actividade de Mário Silva e Sousa, apontado pelos sócios da Manuel Pereira Roldão.
O prazo da procuração termina à meia-noite de hoje, ignorando-se ainda se Fernando Rela estárá na disposição de continuar e qual a posição que os accionistas da empresa tomarão. Carlos Antero não adiantou nada sobre esta questão, limitando-se a afirmar que hoje tirará as «ilações desta experiência, as quais serão transmitidas à assembleia de credores», na qual não estará presente, mas representado por Mário Silva e Sousa.
Salários por pagar
A questão salarial, que despoletou a luta recente dos trabalhadores da MPR, poderá voltar à ordem do dia, já que até ontem ainda não tinham sido pagos os salários de Janeiro.
Na Marinha Grande há já quem diga que a «história se vai repetir», isto é, que os trabalhadores voltarão à situação de salários em atraso. Durval Gaspar desdramatiza para já a situação, seja «porque eles já estavam habituados a receber o ordenado de um dado mês a 20 do mês seguinte», ou porque «estão empenhados na recuperação da Manuel Pereira Roldão» e afirma que «é provável» que os salários de Janeiro sejam pagos hoje, uma ideia corroborada por Carlos Antero.
Sublinha que desde que a fábrica reiniciou a laboração em princípios de Janeiro, a produção aumentou «entre 15 a 20 por cento», tendo sido entregues 30 mil contos de encomendas e havendo mais 20 mil contos em produtos «quase terminados». Diz ainda que o aumento da produtividade é tanto mais importante quanto , «na parte de produção há menos 35 trabalhadores» alguns por estarem de baixa, outros por terem encontrado trabalho noutras fábricas do sector de cristalaria.
Excluída, na óptica dos trabalhadores, está a hipótese do regresso de Carlos Antero à gestão da fábrica. O dirigente sindical afirma que aquele administrador "não tem condições para entrar» na empresa e acrescenta que, a meio da semana passada, Carlos Antero e Azevedo Coutinho tentaram entrar na MPR, mas «só lá estiveram 20 minutos». Durante esse tempo, diz, os dois sócios da MPR «começaram a carregar uma carrinha, mas os trabalhadores obrigaram-nos a sair», sem levarem nada. Carlos Antero nega esta versão e diz que foi à empresa para uma reunião e que os trabalhadores «intempestivamente» disseram que parariam a laboração, o que o levou a sair. Acrescentou que queria levantar um «caixote com papéis e haveres pessoais» que não pode levar consigo, mas que mais tarde lhe foi entregue. João Seabra
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