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<DOCNO>PUBLICO-19950207-150</DOCNO>
<DOCID>PUBLICO-19950207-150</DOCID>
<DATE>19950207</DATE>
<CATEGORY>Cultura</CATEGORY>
<AUTHOR>JD</AUTHOR>
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Van Halen em entrevista sobre «Balance»
A música em primeiro lugar
Revigorados, mas não reformulados, os Van Halen regressaram em 1995 com «Balance». Um álbum que, segundo nos disseram, em Madrid, Sammy Hagar e Michael Anthony, respectivamente vocalista e baixista da banda, não é para competir com o «grunge». Na ocasião ficou-se também a saber do divórcio recente de Hagar, do «dinheiro gordo» que eles já têm e de como voltaram a pôr a música em primeiro plano.
PÚBLICO -- O vosso regresso em 1995 acontece sob o signo do «balanço». É um «balanço» entre o quê?
SAMMY HAGAR -- «Balance» é um título para um álbum, não é necessariamente um conceito. É simplesmente um bom título...
P. -- Poderá ver-se «Balance» como o primeiro grande contra-ataque do rock estabelecido após o «grunge»?
S.H. -- Não é algo contra o que quer que seja. Só estamos a fazer mais um álbum dos Van Halen. Eu já vi o «heavy metal» surgir e desaparecer três vezes. E os Van Halen continuaram sempre. Acho que é o que tentamos fazer: manter essa parede de pé, e não entrar numa competição com o «grunge» ou outra coisa qualquer.
MICHAEL ANTHONY -- Só tentamos fazer a música que sentimos ser a melhor.
S.H. -- É engraçado porque, na América, a canção que retirámos de nº1 nas tabelas com «Don't tell me», o primeiro «single» de «Balance», era dos Pearl Jam. E estou contente por isso, não por termos derrotado os Pearl Jam, mas simplesmente porque temos um disco em nº1. E isso faz-nos sentir assim... «yesssss».
P. -- Os Bon Jovi, por exemplo, foram capazes de se reajustar aos novos tempos. Vocês acham que com este vosso regresso, que soa um pouco semelhante ao passado, as pessoas ainda manterão interesse no grupo?
M.A. -- Sim, neste tempo em que estivemos afastados, o que fizemos foi escrever sobre as nossas experiências pessoais dos últimos três anos. Isso não tem nada que ver com entrar em modas, não nos reajustámos a nenhuma corrente. Nós fomos sempre os Van Halen, fizemos sempre a música que sentimos.
S.H. -- Os Van Halen são os inventores de um estilo específico no rock, quando se fala em Van Halen nunca se consegue dizer «parecem-se com esta banda ou aquela». Há é sempre esta ou aquela banda que se parece com os Van Halen. E os originais ficam sempre. Quando se volta para trás na contemplação da arte, para Rembrandt, Picasso, Goya, as pessoas que tinham um estilo ficam sempre. Os que os imitavam apareciam durante algum tempo, porque o que faziam estava na moda, tinham algum sucesso, mas depois desapareciam.
Amor & dinheiro
P. -- Este álbum novo foi construído em quatro meses de estúdio, depois de quatro anos em que não gravaram canções novas. Não é um bocado auto-indulgente ir para estúdio sem canções depois de tanto tempo?
M.A. -- Nós não estivemos propriamente parados durante esse tempo, lançamos o álbum ao vivo e andámos em «tournée». Além disso, o nosso «manager» faleceu, e foi uma coisa que tivemos de ultrapassar. No fundo foram só dois ou três meses antes de voltarmos a entrar em estúdio.
S.H. -- E, se tivéssemos estado parados durante dez anos, seria a mesma coisa, porque é assim que fazemos desde que o Eddie (Van Halen) construiu o estúdio 5150 em casa. Eu e o Eddie somos os principais compositores, mas não nos sentamos sozinhos com guitarras acústicas e fazemos canções. Fazemos tudo com a banda. O Eddie começa a tocar, o Alex e o Michael juntam-se-lhe, eu oiço e tento alinhar umas palavras. Depois vou para casa e acabo uma letra. Às vezes demora três meses, outras leva só uma noite. Depois fica uma canção e gravamos. Acho que esse método produz discos melhores, porque fica tudo fresco. Fazer uma canção, depois ensiná-la aos outros, ensaiar, vir o produtor e fazer alterações, reaprender a canção e, depois, gravar são demasiados passos, a canção vai perdendo a vida. Assim, quando se grava, ela ainda está numa fase excitante. De outro modo fica perfeita, mas talvez em demasia.
M.A. -- Não gostamos de que as coisas fiquem demasiado perfeitas.
P. -- Por que fizeram neste disco uma canção chamada «Big fat money», em que dizem «eu quero dinheiro gordo»? Que tipo de afirmação é essa?
S.H. -- Essa canção é uma piada às pessoas que aparecem quando se fica rico. Então surgem advogados, contabilistas, os parentes que já não se vê há 20 anos, e saltam-nos todos em cima. Isto é uma piada acerca deles -- não estou a falar de mim, porque eu já tenho «dinheiro gordo». É a ganância que aparece quando há dinheiro. A ganância é uma das coisas mais feias do planeta, e a maneira de falar disso é gozar com o assunto. Para mim, é uma canção bastante violenta, mas tive de fazer humor negro com ela.
P. -- A maioria das canções de amor deste disco -- «Can't stop loving you», «Not enough», «Aftershock» -- são um bocado nostálgicas, há um sentimento de perda, e até de raiva, nelas. Há alguma razão especial para que isso aconteça?
S.H. -- Eu passei por um divórcio nestes últimos três anos. Fui casado durante bastante tempo e, depois, decidi que não queria viver mais com a mesma pessoa. E essas três canções estão um pouco entre o que ela sente -- «Can't stop loving you» -- e o que eu sinto às vezes -- «Aftershock» --, que é um «não acredito que o tenha feito». É muito difícil deixar alguém depois de um período tão longo, e «Not enough» é um pouco o tipo de relação que tínhamos -- por muito que eu fizesse, ela queria sempre mais. Tinha sempre que provar que estava tudo bem, que a amava, mas ela era muito insegura, e isso deixou-me um bocado maluco. Nunca chegava...
P. -- E não é um bocado injusto para a sua ex-mulher fazer canções, que vão ser ouvidas por milhares de pessoas, acerca de assuntos tão íntimos?
S.H. -- Essas canções não dizem exactamente como as coisas aconteceram. As ideias vieram daí, mas eu tentei dar uma toque poético para as pessoas que possam estar a passar por situações semelhantes ou que tiveram relações semelhantes. Estou só a dizer que é normal sentir-se estas coisas. O amor é uma coisa difícil, pode acontecer de todas as maneiras.
Bon Jovi, a boa oportunidade
P. -- Qual é a diferença entre os Van Halen com Sammy Hagar e com Dave Lee Roth?
M.A. -- Quem? [Risos] Agora a sério, acho que os Van Halen sempre foram um processo de crescimento. E, quando o Sammy entrou para o grupo, acho que isso nos atirou para um novo nível. Foi como começar tudo outra vez.
S.H. -- Eu já era admirador deles antes de entrar, tinha visto alguns concertos e o ênfase estava a ser cada vez mais o espectáculo e menos a música. E, quando há músicos como estes, deixar isso de lado e optar pelo lado do vestir e da maneira como se está em palco é andar para trás. O último concerto do grupo que eu vi era um «não há música». Foram apenas oito canções numa noite inteira...
M.A. -- ... as pessoas diziam que nunca nos conseguiam ver os quatro ao mesmo tempo em palco...
S.H. -- Quando eles me chamaram, eu disse: «Se for assim, não.» Sou músico, o que faço é música. Depois, quando me juntei a eles, foi «uau». Nunca tinha tocado com músicos tão bons na minha vida. Tornámos a pôr a música em primeiro lugar. Não quer dizer que o espectáculo já não seja importante. Mas acho que, agora, o que se usa em palco não é tão importante como a guitarra estar afinada.
P. -- Por que aceitaram fazer uma «tournée» em conjunção com os Bon Jovi?
M.A. -- Pensámos vir à Europa e tocar em pavilhões, mas entretanto os Bon Jovi convidaram-nos e nós aceitámos. Acho que é uma boa oportunidade de tocar para muito mais gente do que de outro modo.
P. -- Mas vocês não são já grandes de mais para tocar antes dos Bon Jovi?
S.H. -- Isso é com as pessoas. Seremos tão grandes quanto somos enquanto estivermos em palco. Não há nenhuma competição. Veja-se, por exemplo, o Woodstock: havia 15 bandas cabeças de cartaz e toda a gente ficou a falar foi dos Nine Inch Nails e dos Green Day, e eles tocaram às 10 da manhã ou qualquer coisa assim. Não importa. Quando se toca, vai-se fazer o que se faz, se se for bom... Mas temos de ter as nossas condições. Se eles dissessem que só podíamos tocar meia hora, não aceitávamos.
Jorge Dias
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