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<DOCNO>PUBLICO-19950514-044</DOCNO>
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<DATE>19950514</DATE>
<CATEGORY>Mundo</CATEGORY>
<AUTHOR>MSL</AUTHOR>
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Joschka Fischer, líder dos Verdes alemães, ao PÚBLICO
«Também nós envelhecemos»
Ermelina Pedrosa, em Bona
O líder dos Verdes no parlamento alemão, Joschka Fischer, não esconde a sua ambição pelo poder. O seu lema é, aliás, «conjugar a moral e os interesses», o que, admite, lhe causou muitos problemas dentro do seu partido. Em entrevista ao PÚBLICO, o antigo ministro do Ambiente do Estado de Hesse diz que o seu partido «nunca foi puramente ecológico» e confirma que procura eleitores nos campos dos sociais-democratas, dos liberais e até dos cristãos-democratas. «Os tempos mudaram»...
Joschka Fischer é o líder do grupo parlamentar dos Verdes no Bundestag, em Bona, e o seu partido é a terceira força política da Alemanha. Nas eleições de hoje, as sondagens dão aos ecologistas a possibilidade de conquistarem entre sete e nove por cento no Estado da Renânia do Norte-Vestefália, mais do que os cinco por cento obtidos em 1991, e cerca de 14 por cento em Bremen, o que lhes possibilitará, eventualmente, uma participação no Governo desta cidade-Estado.
PÚBLICO -- O seu partido tenta recrutar votos junto do eleitorado social-democrata, mas, por outro lado, ainda não desistiu do seu objectivo último, que é uma coligação com o SPD. O que pretendem realmente os Verdes?
JOSCHKA FISCHER -- A Renânia do Norte-Vestefália é o maior «Land» da Alemanha, com 19 milhões de habitantes. Os sociais-democratas governam maioritariamente desde há quase três décadas, uma situação que provocou uma grande imobilidade neste Estado, o mais importante do ponto de vista industrial. Nós pretendemos uma remodelação ecológica da indústria, todavia essa alteração não será possível se o SPD continuar a ter a maioria absoluta. Não somos apenas eventuais parceiros de coligação, mas também concorrentes e queremos, por isso, convencer o maior número possível de eleitores que querem uma coligação verde-vermelha a dar-nos o seu voto.
P. -- Os Verdes são a terceira força política na Alemanha, sobretudo no Ocidente. Nas últimas eleições em Hesse, em Março passado, o seu partido alcançou o seu melhor resultado, com 11,2 por cento dos votos. Quais são as possibilidades reais de repetir este resultado na Renânia e em Bremen?
R. -- A Alemanha é um Estado federalista e, como tal, os «Länder» são todos diferentes. A Renânia do Norte-Vestefália é um estado industrial clássico, por um lado, mas por outro existem já muitos centros de prestação de serviços. Não teremos neste Estado resultados equivalentes aos de Hesse porque ali, tradicionalmente, sempre tivemos sucesso. Mas teremos um bom resultado. Em Bremen a situação é outra. É uma cidade-Estado e, como tal, estou muito optimista. Penso que teremos aí cerca de 14 por cento ou mais. Quanto à Renânia do Norte-Vestefália, os institutos especializados situam-nos entre sete e nove por cento. Pessoalmente, penso que se tivermos mais de seis por cento já é óptimo.
P. -- Contrariamente ao que se passa na Renânia do Norte-Vestefália, onde os seus concorrentes são os partidos clássicos, em Bremen os Verdes terão outros adversários: o PDS [o partido comunista sucessor do SED da ex-Alemanha Oriental e que, pela primeira vez, se apresenta a eleições num Estado do Ocidente] e o AFP [iniciativa de cidadãos intitulada «Trabalho para Bremen», uma dependência dos sociais-democratas]. Quais são as hipóteses dos Verdes, e quem «receiam» mais, o PDS ou o AFP?
R. -- Não receio ninguém. A competição do PDS não me assusta. Não acredito que eles consigam entrar no Parlamento de Bremen. O PDS não foi bem sucedido na lista de candidatos do Leste. A situação é-nos favorável. O que queremos é uma aliança verde-vermelha, uma grande coligação ou até mesmo uma coligação de direita. Quanto ao AFP, um grupo que se separou na ala direita do SPD, é uma incógnita. É difícil prever a quem eles tirarão mais votos, se ao SPD ou aos liberais.
P. -- Na Renânia do Norte-Vestefália, os Verdes fizeram uma campanha eleitoral sobre os postos de trabalho e não tanto sobre temas ecológicos. É uma mudança de rumo político?
R. -- Nunca fomos um partido puramente ecológico, pois sempre tivemos um programa partidário. Quanto mais avançarmos com a ecologia, mais importante será falarmos de postos de trabalho. A política ecológica clássica chegou aos seus limites. O que se trata agora é de remodelar a economia, de criar uma sociedade industrial que leve em linha de conta o meio ambiente. Na Alemanha essa é uma remodelação que tem de estar intimamente ligada à criação de postos de trabalho. Se quisermos combater eficazmente o desemprego, só podemos dar um passo em frente e criar postos de trabalho «futuristas», ou seja, postos de trabalho resultantes da remodelação ecológica.
Política e perspectivas
P. -- Com o objectivo de ganhar as próximas eleições para o Bundestag em 1998, o chanceler Helmut Kohl disse que quer lucrar com o potencial eleitoral dos Verdes, sobretudo com os eleitores que defendem valores conservadores. Pode comentar as declarações do chefe do Governo?
R. -- Só posso dizer que Helmut Kohl, por vezes, fala muito. Se passar em revista as sondagens e a minha curva de popularidade, os resultados são outros. No que me diz respeito, antevejo a concorrência com o chanceler com muita satisfação.
P. -- Não é só o chanceler que prepara a sua táctica eleitoral para o próximo Bundestag. O semanário «Die Woche» escrevia que, na sua opinião, uma maioria verde-vermelha no Bundestag seria mais fácil de alcançar se os liberais saíssem do Parlamento. Como pensa ajudá-los?
R. -- Essa questão terão os eleitores de resolver. Para já, vamos ver se, a 14 de Maio, os liberais voltarão ou não aos parlamentos de Düsseldorf e de Bremen.
P. -- O senhor é o verdadeiro político da oposição em Bona. É também um político desejoso de poder, o que é raro entre os Verdes. O seu lema político é «conjugar a moral com os interesses». Essa posição cria-lhe dificuldades no partido?
R. -- Tive grandes problemas partidários com isso e tentei solucioná-los.
P. -- Como?
R. -- Durante dez anos tivemos violentas controvérsias no partido, o que nos custou quase a nossa existência política, pelo menos na Alemanha Ocidental, em 1990, quando fracassámos e não conseguimos superar a barreira dos cinco por cento. O partido aprendeu a lição e hoje tenho menos problemas.
Os tempos mudaram...
P. -- Mas esses problemas ainda existem e os seus amigos políticos não gostam que o senhor esteja no centro das atenções.
R. -- Os tempos mudaram...
P. -- Ou foram os Verdes que mudaram de rumo?
R. -- Não, não é uma questão de rumo político, mas sim da experiência. Os Verdes compreenderam que a programática da política é muito importante e que a credibilidade ainda é mais importante. E que tudo isso, afinal, é representado por pessoas. Os programas são elaborados por pessoas e têm depois de ser transpostos para a realidade por políticos. Evidentemente que os Verdes continuarão a ser um partido antiautoritário. Nunca iremos ter congressos jubilantes, e é bom que assim seja.
P. -- Mas o senhor continua a querer ir buscar potencial eleitoral aos sociais-democratas, liberais e, se possível, até aos cristãos-democratas.
R. -- Daremos as boas-vindas a qualquer um. Seria absurdo se dissesse o contrário. As questões relacionadas com o Estado de Direito, a defesa da liberdade individual, a protecção das minorias, o direito à concretização dos ideais pessoais e de configuração da própria existência são, no fundo, temas clássicos da esquerda liberal, e que desde há muitos anos defendemos. Os liberais libertaram-se deles. Nós tornámo-nos o partido dos cidadãos, da defesa dos direitos humanos, a par do partido ambientalista. Isto por um lado. Por outro, e como componente lógica dos programas ecológicos, evidencia-se cada vez mais um outro aspecto, o da remodelação ecológica da nossa indústria. Essa será uma questão que dirá respeito à política financeira, económica e industrial.
Fui durante muito tempo ministro do Ambiente em Hesse e, de facto, eu era mais ministro da Indústria do que outra coisa. A indústria dialogava mais comigo do que com o ministro da Economia, que se limitava a administrar as subvenções. Eu é que era o responsável pelas autorizações nas instalações industriais de alto risco, eu «administrava» a poluição do ar e das águas. Dantes, essa tarefa competia ao ministro da Indústria. Mas tudo isso tem a ver com o ambiente. A política ambiental transforma-se sem que, no entanto, se desista do tema. Mas à medida que esse tema [ecologia] se radicaliza, passa a ser também um tema de política económica, financeira e industrial. São essas as alterações fundamentais. E é claro que também nós envelhecemos.
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