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<DOCNO>PUBLICO-19950601-049</DOCNO>
<DOCID>PUBLICO-19950601-049</DOCID>
<DATE>19950601</DATE>
<CATEGORY>Economia</CATEGORY>
<AUTHOR>MAG</AUTHOR>
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Preço por acção situar-se-á nos 2850 escudos
Telecom encaixa receita da privatização
Maria Augusta Gonçalves
Será nulo ou quase o encaixe do Estado, com a privatização da Portugal Telecom. Dos 150 milhões de contos que podem resultar da venda, 80 milhões vão para o fundo de pensões, outros 50 milhões entram na empresa por via da troca de acções da Marconi. O preço por acção situar-se-á acima dos 2800 escudos.
«A Portugal Telecom [PT] passou no teste do mercado e agora pode negociar, nas melhores condições, uma ou mais alianças estratégicas», disse o ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Joaquim Ferreira do Amaral. Em declarações ao PÚBLICO, defendeu a estratégia que definiu para a privatização -- da cisão dos CTT, em 1992, à fusão das operadoras na PT --, como razão para a resposta do mercado à venda da operadora.
Ferreira do Amaral defende ainda a aceleração do processo, com a entrega da gestão da PT a privados, antes da liberalização. Para o futuro, deixa um aviso: «A próxima fase deve ir até aos 49 por cento do capital. Depois, é preciso fazer a alteração legislativa que permita privatizar os cem por cento da empresa.»
As afirmações de Ferreira do Amaral têm uma base de sustentação. Passam pelo que chama «o teste de mercado» a que se sujeitou a PT. De acordo com operadores financeiros, a procura de acções ultrapassou a oferta em 5,5 vezes; o capital foi pulverizado, nos mercados internacionais, por fundos de pensões e de investimento; nenhum operador internacional tentou tomar mais de um por cento da empresa. A participação nacional terá ainda garantida perto de 50 por cento do total das acções colocadas.
A primeira fase de privatização da PT previa a colocação de 26,3 por cento do capital, mas a procura alargou a «tranche» de venda aos 53,2 milhões de acções, de acordo com o previsto no decreto-lei que regulava a operação. Quanto ao preço a praticar, dentro do intervalo definido pelo Governo (dos 2500 aos 3100 escudos), tudo ficou dependente das ofertas feitas ao lote para venda directa (23 milhões de acções), nos mercados internacionais.
Preço final
É de acordo com essas ofertas que o Governo vai decidir hoje, em conselho de ministros, o preço final da PT. Segundo fontes do mercado, tudo indica que o preço se situará um pouco acima dos 2800 escudos, sendo os 2850 o mais provável. A maioria das ofertas iniciais situa-se um pouco abaixo dos 2700. As últimas ofertas, feitas até às 23 horas de ontem, em Nova Iorque, ultrapassavam já os três mil escudos.
A fixação de um preço de 2850 escudos, permitirá uma receita de 150 milhões de contos. Deste total, 80 milhões destinam-se à constituição de provisões para o fundo de pensões da PT, que apresenta insuficiências de 114 milhões de contos; outros 50 milhões, resultantes da «tranche» de 17 milhões de acções para a troca com os privados da Marconi, entrarão nos activos da operadora nacional. Do total da venda, será ainda paga uma comissão de 3,4 por cento ao consórcio colocador das acções, composto pelo Banco Essi, a Merril Lynch, a SG Warburg e o UBS. O Estado, a fazer algum encaixe, será apenas abaixo dos dez milhões de contos.
Ferreira do Amaral não está preocupado com esta perspectiva. «A entrada de 80 milhões de contos no fundo de pensões abate uma dívida pública». Por outro lado, a capitalização da empresa afigura-se-lhe «do interesse do Estado.» Com o endividamento da empresa abatido e passado «o teste do mercado, podemos negociar uma ou mais alianças estratégicas no mesmo pé.»
Outro elemento que não preocupa Ferreira do Amaral é a possível presença do grupo Espírito Santo no capital da PT. Um dos dois administradores privados da empresa deverá representar os interesses daquele grupo.
«Importante era garantir que o sector das telecomunicações continuasse a ser português e garantimos. O GES tem uma tradição no sector. E o país que não dominar as suas telecomunicações, não vai acompanhar o desenvolvimento.» Lembra que, num cenário de liberalização, o país perdeu sempre no embate com o mercado. «Foi assim na indústria, foi assim com as companhias aéreas. Se se tivesse feito o mesmo com a indústria automóvel nos anos 20, hoje havia modelos nacionais. Portugal não podia perder o domínio das telecomunicações.»
Acções para a liberalização
«A decisão de levar a PT ao mercado foi política», afirma Ferreira do Amaral. «Se quiséssemos fazer dinheiro com a venda, podíamos ter escolhido um parceiro estratégico, que entrasse no capital, antes de levar a PT ao mercado. Mas não tínhamos um sector português de telecomunicações. Agora podemos pensar na organização da empresa e na liberalização, com mais segurança.» Ferreira do Amaral acredita que esta possa ocorrer no final do ano 2000.
«O teste de mercado», que coloca o valor global da PT nos 541 milhões de contos, «permite-nos ter uma margem de manobra», pensar em alianças com operadores internacionais. «Mas isso depende do que temos para oferecer.» O que passa pela melhoria de serviços, pelo rebalanceamento tarifário. E pelo aproveitamento dos projectos da Telepac (em possível aliança com outros operadores) e da Marconi nos mercados asiáticos e brasileiro. «Mesmo que sejam mercados desorganizados, são bons investimentos no futuro.» Outro terá sido o lançamento da TV Cabo Portugal, como projecto nacional. Os investidores olham-na como a segunda rede fixa do país. «Estávamos certos quando decidimos lançá-la para ocupar terreno.»
Neste momento, Ferreira do Amaral, em conjunto com a «holding» estatal Comunicações Nacionais (CN), estuda a possibilidade de haver uma terceira rede celular em PCN (altas frequências). «Ainda não sabemos se vai haver ou se vamos reforçar as já existentes», com a expansão de serviços. Mas a decisão será tomada antes das eleições. Quanto às propostas de liberalização das redes de televisão por cabo, a discutir no Luxemburgo, pelos Quinze, diz que tudo depende de os outros mercados permanecerem ou não fechados.
Ferreira do Amaral considera o trabalho que desenvolveu com o presidente da CN, Eurico Cabral da Fonseca, para a racionalização do sector das telecomunicações, como «o mais importante» do seu trabalho no Ministério. «Porque as telecomunicações ficam, mas as estradas passam.»
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