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<DOCNO>PUBLICO-19950718-042</DOCNO>
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<DATE>19950718</DATE>
<CATEGORY>Diversos</CATEGORY>
<AUTHOR>LP</AUTHOR>
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À mesa
Só não percebo aquela ideia das ostras gratinadas
João Paulo Martins
Jornalista de vinhos
No campo na praia e na cidade, quais são, na sua opinião, os melhores restaurantes portugueses? E porquê?
No campo, voto na Tia Alice, em Fátima. É uma comida «santa», pela qualidade e simplicidade. Por vezes os restaurantes da província tendem a marcar a sua diferença pela quantidade exagerada de comida que servem aos clientes. São as grandes bacalhauzadas e as costeletas de vaca que saem fora das travessas. Como estou cada vez menos inclinado a este tipo de comida, acho que na Tia Alice é que é.
Na praia, o prazer da proximidade do mar sobrepõe-se por vezes à qualidade da comida. Lembro-me por isso do restaurante da Fábrica, perto de Cacela Velha, no Algarve. Só não percebo aquela ideia das ostras gratinadas, em vez de serem servidas sobre gelo e com uma rodela de limão, como manda o bom gosto.
Na cidade, tenho duas opções: em Lisboa, o Conventual, onde algum requinte sem maneirismos fazem da refeição um prazer sempre a recordar. Em Évora, o Fialho; neste caso tenho sempre pena de não ter capacidade de absorção para todas as pequenas iguarias que nos servem. Em qualquer dos casos, são restaurantes onde o vinho tem trato de primeira, pela diversidade das propostas e pelo serviço cuidado.
Qual é o seu prato favorito?
Depende da época do ano. No tempo frio, gosto de fazer um cabrito assado. Só ainda não consegui ter um forno de lenha em casa, mas mesmo assim o resultado costuma receber muitos aplausos. No Verão, deixo-me perder pelos peixes, de que sou grande devorador. O prato que me deu mais prazer fazer e que é de arrasar foi uma sopa de ostras: dá um trabalho horrível, mas é das coisas divinas que algum dia provei. Acredito que me tenha sabido especialmente bem porque foi acompanhada por Champagne Tattinger, o que torna o resultado final qualquer coisa de magnífico.
Sugira-nos uma viagem de férias ao estrangeiro. Não esquecendo as referências gastronómicas locais...
Vale a pena conhecer Bordéus e arredores. A cidade é bonita, tem um enorme bairro antigo bem conservado, com muita coisa para ver. A região dos Chateaux no Médoc é espectacular e a pequena cidade de Saint-Emilion é um mergulho na Idade Média. Para tirar a barriga de misérias, há que provar as ostras de Arcachon, o «foie gras» do Perigord, daquele que nos faz nunca mais querer ouvir falar de «pâté». Ponto de paragem obrigatória para comer bem e beber muito melhor: Bistrot du Sommelier. Aí vai perceber que a história de os vinhos serem caros no restaurante é conversa esfarrapada de quem, por cá, tem uma limitada visão do que deve ser o negócio da restauração. Não se deixe levar na conversa dos bolinhos de canela que há por todo o lado à venda e que ficam a anos-luz de um bom bolo cá da terra.
Qual é, para si, a bebida alcoólica que melhor combate o calor?
Um espumante natural bem fresco na varanda em frente ao mar, ou um Porto branco servido em copo alto, com água tónica, gelo e limão!
Imagine que era proprietário de um restaurante ou de um bar. Que nome lhe daria? E que especialidades teria para propor aos seus clientes?
Já me passou muito vagamente pela cabeça ter um restaurante, mas acho que prefiro cozinhar apenas para um máximo de 12 pessoas; acima desse número, torna-se a coisa muito complicada. Mas se tivesse um restaurante, teria que servir robalo ao sal, um prato regional que me sai bem -- cabidela de galinha -- e um outro que é muito bom mas um pouco estranho para quem ouve falar nele pela primeira vez: faisão estufado em borras de Vinho do Porto Vintage. Acreditem que, depois de provado, é de cortar a respiração...
Quem são, habitualmente, os seus companheiros de mesa?
Variam muito, mas faço questão de juntar sempre amigos que sejam bons apreciadores de vinho. Claro que há os «grandes» apreciadores, como os membros do Copus Ensemble, o mais restrito, elitista e liberal clube de vinho, que se mantém com os mesmos oito membros que o fundaram há dez anos. Os melhores vinhos do mundo tenho a sorte de os ter provado quase sempre ao lado de um apreciador que é «maluco» pelo vinho -- o Dirk Niepoort.
Fico satisfeito por saber que, mesmo aqueles amigos que normalmente não são consumidores, se rendem ao provar bons vinhos lá em casa.
O que é que é capaz de lhe estragar uma refeição?
A presença de pessoas que não apreciam as coisas boas da vida, que só falam das misérias dos ordenados e das desgraças do trânsito; os contadores de anedotas e os chatos que dizem que não têm vícios, mas que são uns infelizes. Também me irritam os que acham que o Champagne é bebida de senhoras, que os vinhos brancos são produtos menores e que os brancos doces são vinhos para meninos. Mas como vou tendo capacidade de selecção, com gente desta, se não puder zarpar, até prefiro beber cerveja...
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