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Por constituintes descontínuos entende-se a interrupção de um sintagma ou oração por outros constituintes não pertencentes a esse sintagma ou oração. Os constituintes responsáveis pela descontinuidade podem ser vários. Quanto à forma, os elementos descontínuos são tipicamente sintagmas e orações (nós-terminais). No entanto, há um caso específico de descontinuidade em nós-terminais (ver secção 9.1.).
A descontinuidade pode ocorrer num sintagma, interrompendo-o em duas ou mais partes.
A representação de constituintes descontínuos é a seguinte para a descontinuidade em duas partes:
F:f-, para a primeira parte do constituinte descontínuo
-F:f , para a segunda parte do constituinte descontínuo.
A representação da descontinuidade de um constituinte em três (ou mais) partes é a seguinte:
F:f- , para a primeira parte do constituinte descontínuo
-F:f- , para a(s) parte(s) intermédia(s) do constituinte descontínuo
-F:f , para a última parte do constituinte descontínuo
É importante salientar que os símbolos da descontinuidade (-) não marcam os elementos que causam a deconstinuidade, isto é, não marcam os interruptores, mas sim os sintagmas que contêm elementos descontínuos.
Os seguintes exemplos ilustram tipos de descontinuidades:
CP819-2 Mas esse direito foi-me sempre negado», afirma a testemunha, A. Carvalho.
…
==SUBJ:np
===>N:pron-det('esse' <dem> M S) esse
===H:n('direito' M S) direito
==P:vp-
===AUX:v-fin('ir' <hyfen> PS 3S IND) foi-
==DAT:pron-pers('eu' <refl> M/F 1S DAT) me
==ADVL:adv('sempre') sempre
==-P:vp
===MV:v-pcp('negar' M S) negado
=»
...
Em CP819-2, acima, a estrutura do sintagma verbal, verbo + auxiliar ("foi negado"), é interrmpida, e por isso o vp recebe a marcação de descontinuidade.
CP320-6 Ambos os textos foram recuperados para a cena pela companhia Marionetas de São Lourenço (seguindo textos do «Judeu»), cujos fundadores são também os responsáveis pela constituição do Museu -- Helena Vaz e José Gil.
A1
STA:fcl
=SUBJ:np
==>N:pron-det('ambos' <quant> M P) Ambos
==>N:art('o' <artd> M P) os
==H:n('texto' M P) textos
=P:vp
==AUX:v-fin('ser' PS 3P IND) foram
==MV:v-pcp('recuperar' M P) recuperados
…
=PASS:pp-
==H:prp('por' <sam->) por
==P<:np-
===>N:art('o' <-sam> <artd> F S) a
===H:n('companhia' F S) companhia
===N<:prop('Marionetas_de_São_Lourenço' F P) Marionetas_de_São_Lourenço
=(
=ADVL:icl
==P:v-ger('seguir') seguindo
==ACC:np
===H:n('texto' M P) textos
===N<:pp
====H:prp('de' <sam->) de
====P<:np
=====>N:art('o' <-sam> <artd> M S) o
=====«
=====H:prop('Judeu' M S) Judeu
=====»
=)
=-PASS:pp
==-P:np
===,
===N<PRED:fcl
====SUBJ:np
=====>N:pron-det('cujo' <rel> M P) cujos
=====H:n('fundador' M P) fundadores
====P:v-fin('ser' PR 3P IND) são
====ADVL:adv('também') também
====SC:np
=====>N:art('o' <artd> M P) os
=====H:adj('responsável' <n> M P) responsáveis
=====A<:pp
======H:prp('por' <sam->) por
======P<:np
=======>N:art('o' <-sam> <artd> F S) a
=======H:n('constituição' F S) constituição
=======N<:pp
========H:prp('de' <sam->) de
========P<:np
=========>N:art('o' <-sam> <artd> M S) o
=========H:n('museu' <prop> M S) Museu
=====--
...
CP46-1 Na mesma ocasião iniciaram-se investigações que incidiram sobre o árbitro madeirense Marques da Silva, também ele suspeito de se ter deixado corromper.
…
=P:v-fin('iniciar' PS 3P IND) iniciaram-
=ACC:pron-pers('se' <refl> F 3P ACC) se
=SUBJ:np
==H:n('investigação' F P) investigações
==N<:fcl
===SUBJ:pron-indp('que' <rel> F S) que
===P:v-fin('incidir' PS 3P IND) incidiram
===PIV:pp
====H:prp('sobre') sobre
====P<:np
=====>N:art('o' M S) o
=====H:n('árbitro' M S) árbitro
=====N<:adj('madeirense' M S) madeirense
=====N<:prop('Marques_da_Silva' M S) Marques_da_Silva
=====,
=====N<PRED:np
======>N:adv('também') também
======H:pron-pers('ele' M 3S NOM) ele
======N<:icl(<pcp>)
=======P:v-pcp('suspeitar' M S) suspeito
=======PIV:pp
========H:prp('de') de
========P<:icl
=========ACC:icl-
==========ACC:pron-pers('se' <refl> M 3S ACC) se
=========P:vp
==========AUX:v-inf('ter') ter
==========MV:v-pcp('deixar') deixado
=========-ACC:icl
==========P:v-inf('corromper') corromper
=.
CP874-2 O que era preciso fazer, está feito: derrotar uma iniciativa do Governo.
A1
STA:fcl
=SUBJ:fcl-
==SUBJ:icl-
===ACC:np-
====H:pron-indp('o_que' <rel> M S) O_que
==P:v-fin('ser' IMPF 3S IND) era
==SC:adj('preciso' M S) preciso
==-SUBJ:icl-
===P:v-inf('fazer') fazer
=,
=P:v-fin('estar' PR 3S IND) está
=SC:v-pcp('fazer' M S) feito
=:
=-SUBJ:fcl
==-SUBJ:icl
===-ACC:np
====APP:icl
=====P:v-inf('derrotar') derrotar
=====ACC:np
======>N:art('um' <arti> F S) uma
======H:n('iniciativa' F S) iniciativa
======N<:pp
=======H:prp('de' <sam->) de
=======P<:np
========>N:art('o' <-sam> <artd> M S) o
========H:n('governo' <prop> M S) Governo
=.
O caso em que houve necessidade de tornar um nó terminal descontínuo relaciona-se com a repetição da preposição em dois sintagmas preposicionais contíguos que não são independentes. Em particular, a descontinuidade em nós terminais é observada quando: 1) no segundo sintagma preposicional, o complemento da preposição repetida é dependente (aposto, modificador, etc.) do complemento da preposição no primeiro sintagma preposicional, e 2) existe um aposto comum a dois complementos de preposição.
Os seguintes exemplos ilustram 1) e 2), respectivamente:
CP221-1 Um quarteto formado por Bob Mover (sax alto e voz), Carlo Morena (piano), Pedro Gonçalves (contrabaixo) e João Silvestre (bateria) actua a partir das 23h, na catedral lisboeta do jazz: no Hot Clube de Portugal .
CP185-3 No momento em que a União Europeia decidiu abandonar a exploração do carvão de pedra, existem cinco mil mineiros portugueses no Norte de Espanha, nas províncias de León e das Astúrias, condenados a assistir ao encerramento das minas onde trabalham.
Em CP221-1, o Hot Club de Portugal é o aposto de a catedral lisboeta do jazz . No entanto, a simples representação desta estrutura é dificultada pela repetição da preposição em o que faz com que o aposto do complemento da preposição seja também ele um complemento de uma preposição. Ou seja, o Hot Clube de Portugal tem uma dupla função em dois sintagmas distintos: como complemento da preposição, por um lado, e como aposto de um np em outro sintagma.
Em 185-3, a situação de dupla função é semelhante; as províncias de León e das Astúrias elabora o sentido de o Norte de Espanha (N<PRED ou N<) e ao mesmo tempo é complemento da preposição (em), em sintagmas distintos.
Deste modo, a descontinuidade das preposições não significa que a preposição em si seja descontínua, mas que existe uma repetição da mesma preposição e, assim, pretende-se também representar o facto de não se estar, semanticamente, perante sintagmas diferentes, fazendo com que os elementos internos nos dois sintagmas se possam relacionar sintacticamente.
Estes são casos muito pontuais, observando-se apenas em CP75-1, CP185-3 e CP221-1.
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