Revisão da parte portuguesa do Museu da Pessoa

AC/DC, Linguateca
O núcleo português do Museu da Pessoa facultou-nos gentilmente as transcrições das entrevistas para incorporar no AC/DC, mas cedo nos demos conta de que os textos continham muitos erros de ortografia e várias inconsistências ortográficas.

Resolvemos, por isso, dar início ao processo de revisão do texto, de forma a evitar que os erros de transcrição prejudicassem o uso deste corpo para fins didáticos, e para o tornar globalmente mais fiável para estudos lexicais ou sintáticos.

Nesta página, documentamos as opções tomadas na revisão do texto, nos casos em que as consideramos não triviais. Notamos que para este trabalho apenas tivemos acesso às transcrições, e não ao som original.

As entrevistas têm a indicação dos entrevistados na página dos metadados.

Nota: As duas entrevistas que correspondem a falantes brasileiros não foram, evidentemente, corrigidas para a norma portuguesa.

Publicámos um artigo sobre este processo: Taveira & Santos (2016).

Palavras desconhecidas

Quando não foi possível determinar com alguma certeza qual a palavra ou palavras pronunciadas, optámos por as incluir entre aspas. Exemplos são cúlmio, pantesma, abrotigas e balander. Quando na própria transcrição inicial se encontra a indicação de que o que foi dito não foi compreendido, por exemplo através de ---------(faixa2 2m5s), escolhemos colocar ININTELIGÍVEL.

Regionalismos e formas populares

No caso de num e prontos, corrigimos sempre para não e pronto respetivamente, mas em casos em que a forma popular tinha a mesma classificação gramatical, por vezes mantivemos, como gurita para guarita.

Posição dos clíticos

Aparentemente existe grande disparidade entre as normas escritas e o discuro oral nesta matéria. Optámos por corrigir a posição, mas deixar indicada também a formulação original. Alguns exemplos:

Problemas de concordância e de regência

Para salvaguardar a possibilidade de os textos constituírem um documento interessante das características da oralidade, corrigimos, guardando a versão original para eventual inspeção dos interessados, os seguintes problemas: (i) lapsos de concordância (que podem ser do transcritor ou do entrevistado), (ii) casos em que faltam ou sobram pronomes pessoais, e (iii) casos em que a preposição usada não é a padrão.

Vejam-se os seguintes exemplos:

Casos muito interessantes são os que denominamos "concordância alargada", que por agora não corrigimos, e que se referem à mistura de plural e singular em coordenações, como são os casos seguintes:

Pronúncia estranha de nomes estrangeiros

Em alguns casos a maneira de pronunciar (ou de transcrever) era diferente da padrão. Quando a diferença era simplesmente ortográfica, corrigimos sem mais. Se a diferença fosse patente na pronúncia, corrigimos mas deixámos, mais uma vez, o original para inspeção. Exemplos são:

Nomes próprios duvidosos

Por vezes a grafia dos nomes próprios, sobretudo apelidos, suscitou-nos dúvidas.

Quando havia um nome mais provável, usámos, como foi o caso de Otília Custório, rebatizada Otília Custódio.

Quando havia mais de uma grafia rara para a mesma pessoa numa mesma entrevista, por exemplo Acílio e Arcírio, usámos a primeira que apareceu.

Um caso engraçado foi o de Papa Piedoso (na transcrição), que foi recuperado para Papa Pio XII.

Outros exigiram procura na internete, como foi o caso de Morreu aqui há dias o professor de Filosofia da Ciência, que era o melhor professor de Filosofia e Ciência em Portugal, Passo Sousa Alves, que foi corrigido para professor Sousa Alves.

Da mesma forma, Abade Loureiro foi passado para Abade da Loureira, após investigação sobre a zona referida.

Lar da Cabrada, por seu lado, foi considerado corresponder a Lar da Quebrada, embora seja o nome de uma escola antiga e portanto difícil de ter a certeza absoluta.

Quanto a Linhais da Serra, foi passado para Unhais da Serra.

Outro caso de transcrição inesperada, que nos pareceu impossível, foi Finais Críticos da Filosofia Portuguesa, que alterámos portanto para Dicionário Crítico da Filosofia Portuguesa.

Tempos verbais

Inesperadamente, houve também vários casos de correção de tempos verbais, quer em discurso indireto quer em subordinadas temporais ou concessivas, como os seguintes exemplos ilustram: Convém contudo notar que uma das entrevistas (E008) foi feita a uma pessoa de nacionalidade inglesa.

Casos em que tivemos de interpretar

Nem sempre é fácil, com base apenas na transcrição, saber qual o sentido. Alguns exemplos: Os operários devem saber o que podem exigir na empresa sem que a empresa vá abaixo, porque os patrões estão a explorar os operários quando paga a menos é porque não pode pagar.

Claramente o sentido é muito diferente se for corrigido destas duas maneiras:

  1. Os operários devem saber o que podem exigir na empresa sem que a empresa vá abaixo, porque os patrões estão a explorar os operários quando pagam a menos e é porque não podem pagar.
  2. Os operários devem saber o que podem exigir na empresa sem que a empresa vá abaixo, porque os patrões estão a explorar os operários... Quando (o patrão) paga a menos, é porque não pode pagar.
Outro exemplo é Estes restaurantes já são um bocadinho antigos, embora estejam mais embelezados, não é, talvez consoante vai subindo vão ficando mais embelezados, mas digo-lhe uma coisa: já havia estes restaurantes, havia na mesma. Há duas interpretações em relação à subida, a primeira das quais implica a correção para vão:

Casos como em, do, de D. Pedro V correspondem a outro tipo de desafio para compreender o texto e corrigi-lo ou não. Por vezes a menção a D. Pedro V foi interpretada como rua ou escola ou como largo ou colégio ou edifício.

Em alguns casos, houve dúvida sobre se estávamos em presença de um lapso ou de uma variante possível. Nesses casos, por vezes não se corrigiu, outras sim:

O mais importante é que fiquem aqui documentados, por isso uma lista exaustiva de diferenças de opinião ou de interpretação será compilada, e tornada pública, no fim da revisão.

Mas é também importante salientar que, mesmo que haja concordância sobre a existência de um problema, nem sempre a correção proposta é a única possível:

Lapsos que não corrigimos

Optámos por não corrigir o que depois do advérbio quase. Com rigor, como diria Evanildo Bechara, este que pode ser dispensado, e "os puristas têm condenado tais modos de dizer", mas também é verdade, citando o mesmo gramático, que "é frequente o aparecimento de um que expletivo depois de conjunções, advérbios e expressões adverbiais".

Em alguns casos, falta certamente material da transcrição, mas não é possível adivinhá-lo.

Por exemplo, há uma resposta assim: Nasci em Bustelo em casa, no dia 2 de 1932. Falta o mês, e não conseguimos recuperá-lo.

No caso Foi em 1952/52 corrigimos para Foi em 1952/53, embora também o pudéssemos ter feito para 1951/52.

A pergunta Com 12 anos? surge um pouco abruptamente no encadeamento (ou sem encadeamento...), mas não podemos inventar contexto.

A seguinte descrição também nos suscitou dúvidas: E portanto eu estava ligando palavra por palavra, depois lia a segunda, depois lia a segunda e a primeira, depois ia lendo. Não deveria ser depois lia a primeira e a segunda? Mas não alterámos.

Casos houve também onde não conseguimos compreender o nexo, e tivemos de deixar como estava, como é o caso da parte em itálico do período que se segue: "Regressando poucos dias depois a Portugal, continuou nessa atividade, aonde se mantém e aonde granjeou prestígio, ensina hábil de executar técnica de talhe doce na linha dos artistas do passado."

Caos interessante foi o de «Aqui não», todos nos pusemos aos altos em que não conseguimos decidir, no contexto, se seria pôr aos saltos (expressão corrente) ou pôr aos altos no sentido de pôr a gritar "Alto!" que parece mais natural no contexto em questão.

Filosofia geral

Um revisão textual tende naturalmente a depreciar o estilo coloquial ou pouco formal, substituindo-o por uma linguagem mais cuidada. No caso destas entrevistas, contudo, uma das intenções era ouvir a voz dos entrevistados como eles se expreimem ou exprimiam.

Tentámos, por isso, sempre que fosse possível, não aumentar o grau de formalidade de língua. Um exemplo desta escolha é a pergunta Qual o seu nome?, que nos pareceu possível, embora bastante informal.

Revisão adiada

Alguns casos deixámos por enquanto para uma segunda fase, nomeadamente a questão do discurso direto, que está de momento inconsistente.

Tratamento do discurso direto

Quando os entrevistados contam, em discurso direto, falas de outras personagens, tentaremos usar, numa revisão posterior, as regras de grafia portuguesas, com travessão, e não com aspas.

Como procurar as correções no material

Todas as correções de fenómenos sintáticos e gramaticais foram mantidas através do atributo estrutural <corr>, e podem, portanto, ser interrogadas.

A expressão de pesquisa é:

<corr> []* </corr>

Para obter o texto anterior (original), basta assinalar, na interface de busca, a opção "Mostrar texto original nas correções". O texto original que foi corrigido aparece no fim da frase, em negrito. Quando se trata de adição simples, não aparece nada. Quando algo foi removido, aparece uma versão mais longa.


Autoras: Paula Taveira e Diana Santos.
Última atualização: 14 de abril de 2017.
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